segunda-feira, 28 de junho de 2010

O poema de Deus

No último dos cadernos publicados, José Saramago escreveu: “Os ateus são muito capazes de aventurar-se pelos escabrosos caminhos da teologia.” Esperemos que existam também teólogos capazes de aventurar-se pelos caminhos escabrosos de uma literatura que, no limite, não desiste de ser desconstrução e construção do poema de Deus.
José Tolentino Mendonça
Texto completo em SNPC

CRONICAZ de um Perigri, letra V





«VOU OFERECER-ME AO CARMO.»
A primeira frase do Ven. Eugénio Maria, para o primeiro encontro do primeiro dia do nosso guião. Vou oferecer-me ao Carmo. Também eu nesta Peregri renovei o meu oferecimento ao Carmo e pelo Carmo à Igreja. O movimento d’alma do P. Eugénio Maria foi o meu. Foi o nosso. Saibam os que isto lerem que as Peregris do Carmo Jovem são pelo Carmo, para o Carmo. Todos nos oferecemos ao Carmo: o nosso suor e dores, as ânsias de perfeição e de busca, a nossa entrega é ao Carmo.
Fica registado no fim, mas é desde o princípio.

Frei João Costa


CRONICAZ de um Perigri, letra T





TERÇO
A hora mais bonita e mais querida da Peregri é a do Terço. Ninguém falha, todos rezamos. Em família. É sem dúvida a hora mais amada. A hora por que todos anseiam. A que ninguém esquece. É a hora que meditando os mistérios de Cristo nos fazemos mais homens e mais mulheres. A hora em que comungamos mais a natureza. Haja o que houver por ali: casas ou cafés, farmácias ou oficinas, paragens do autocarro ou garagens, caminhos ou fontes, escolas ou pinheiros, haja o que por ali houver nós rezamos o Terço.
É uma hora bem meditada, bem rezada. Bem passada. Por alguma razão todos a amam mais que qualquer outra.

CRONICAZ de um Perigri, letra S





SANTUÁRIO
Não me canso de dizer que o caminho é duro. Fica a ideia: alguém no último dia caminhava tão cansado que leu Santuário onde estava sanitários! E vai de virar. Coisas. Mas a verdade é que o fito que nos movia era mesmo o de chegar ao Santuário de Fátima.
Os momentos no Santuário foram únicos. Ali entrámos em procissão, mas a Missa que começava na Capelinha impediu que depositássemos as espigas. Regressámos à noite para completar o incompleto. E para, enfronhados nos saco-cama, rezarmos o Terço e acompanharmos a Procissão de Velas. Ainda houve quem por lá se perdesse calmamente em meditação. São horas belas as que por lá se passam.



SILÊNCIO
Uma peregrinação não tem de ser uma coisa ruidosa. Mas por vezes é e ainda bem. E é também uma excelente oportunidade para o encontro connosco próprios. São várias as horas que passamos sozinhos. Há muito ruído à volta? Há. Mas é impossível não ouvir os passarinhos, tantos passarinhos. Tanto que parecem ter-se reunido em coro para nos saudar.
É impossível não nos adentrarmos interiormente, profundamente, calmamente, silenciosamente.
Há quilómetros e quilómetros. Em alguns caminha-se em grupo, noutros separadamente. Cada momento da etapa tem o seu andamento. E quantas vezes por aí vamos nós caminhando como se não existisse mundo nem pés nem caminho! E aí vamos pensando na Vida. Em silêncio. Nós connosco. Nós e Deus que nos olha. Em silêncio. Em paz que se vai conquistando passo a passo.

CRONICAZ de um Perigri, letra R





RAQUEL
Chamávamos-lhe Verónica. Tem agora outro nome, Raquel. Há quem sublinhe muito a sua falta e de facto as coisas no Carmo Jovem são diferentes sem ela. Mas mais que nunca ela nos ajuda a caminhar, mesmo se fisicamente já não caminha connosco. E se há em relação a ela algum sentimento comum é o de que seja feliz e nos dê testemunho dessa fidelidade.




RICARDO
Faz-nos falta como a Raquel. Mas o que todos querem é vê-los fiéis e felizes. E se forem felizes nós seremos fiéis! Sempre lembrados nas nossas orações sabemos que não nos esquecem, e é também por eles que nós caminhamos. Andavam sempre juntos, agora aprecem ainda mais juntos.

CRONICAZ de um Perigri, letra Q





«QUERO VER A DEUS.»
Não é essa a ânsia que faz correr os peregrinos? É. E é essa ânsia que nos fará viver o próximo ano e depois regressar ao caminho. É isso que queremos.


CRONICAZ de um Perigri, letra P





PAIS
As três peregrinações anteriores tiraram-nos de casa no Dia da Mãe. Era sempre uma pena. Aliás, é sempre uma pena não trazer os pais. A alguns custa mesmo muito. Mas nunca são esquecidos. Eles, os irmãos, os amigos, os que nos ajudam, os colegas. Desta vez trouxemos com particular afecto os pais da Raquel.


PALMAS
À chegada somos todos heróis. Todos merecemos palmas. Só um de nós passou pelo carro de apoio e nele não deve ter ido mais meio quilómetro. Todos as merecemos, portanto.
Conforme a tradição a última etapa termina na Rotunda do Peregrino. Depois dum refresco e das palmas e abraços que todos merecemos, de t-shirt bem posta, lá vamos em direcção à Capelinha onde encerramos a Peregrinação. Palmas, pois, para todos. Para o ano há mais palmas.



PÉS
Há quem julgue que o segredo são os pés, mas julgo não o serem. Mas são como um baluarte inexpugnável. São os pés que se firmam nos caminhos, são eles que nos levam, que nos fazem voar. Levam o peso todo em cima, sofrem todo o calor do alcatrão. São quem mais sofre, julgo eu. São também quem mais reza. São mesmo crucificados, por isso merecem todos os cuidados e atenções.

sábado, 26 de junho de 2010

DOMINGO XIII DO TEMPO COMUM

Aproximando-se os dias de Jesus ser levado deste mundo, Ele tomou a decisão de Se dirigir a Jerusalém e mandou mensageiros à sua frente. Estes puseram-se a caminho e entraram numa povoação de samaritanos, a fim de Lhe prepararem hospedagem. Mas aquela gente não O quis receber, porque ia a caminho de Jerusalém. Vendo isto, os discípulos Tiago e João disseram a Jesus: «Senhor, queres que mandemos descer fogo do céu que os destrua?». Mas Jesus voltou-Se e repreendeu-os. E seguiram para outra povoação. Pelo caminho, alguém disse a Jesus: «Seguir-Te-ei para onde quer que fores». Jesus respondeu-lhe: «As raposas têm as suas tocas e as aves do céu os seus ninhos; mas o Filho do homem não tem onde reclinar a cabeça». Depois disse a outro: «Segue-Me». Ele respondeu: «Senhor, deixa-me ir primeiro sepultar meu pai». Disse-lhe Jesus: «Deixa que os mortos sepultem os seus mortos; tu, vai anunciar o reino de Deus». Disse-Lhe ainda outro: «Seguir-Te-ei, Senhor; mas deixa-me ir primeiro despedir-me da minha família». Jesus respondeu-lhe: «Quem tiver lançado as mãos ao arado e olhar para trás não serve para o reino de Deus». [Lc 9, 51-62]

sexta-feira, 25 de junho de 2010

CRONICAZ de um Perigri, letra O





«O ESPÍRITO SANTO NÃO NOS ABANDONA.»
Foi a frase que presidiu ao quarto dia. Visto que peregrinar não é fácil, é sempre bom ter consciência de que a nossa força não somos nós. De que em nós vive Quem nunca nos abandona. De que sempre podemos recorrer a Ele. Há horas difíceis? Há. O Espírito do Ressuscitado é de fortaleza e está sempre connosco para que não paremos de caminhar o caminho da perfeição. E assim foi.



ORAÇÃO
É uma das marcas da Peregri. Ainda o dia não é dia, quer dizer, não é luz, já nós estamos levantados e de malas e maletas aviadas e com corda nos sapatos. Mas não começamos a andar sem rezar. À noite, o mesmo. Quando tudo está refrescado e pronto, antes do descanso, damos tempo à oração em grupo. Ninguém falta.
As horas de solidão também são muitas. São muitas as horas em que caminhamos sozinhos. São horas boas de introspecção. Horas que todos gostamos. O que se reza cada um sabe. Uns rezam rezando, outros caminhando, alguns cantando. Cada um fala ao seu jeito, sei que assim é pelos testemunhos esparsos e discretos que surgem ora aqui ora ali.
Mas a peregrinação é toda ela uma oração. Peregrinar é rezar. Outra forma de rezar. Dos pés à cabeça tudo reza. Sim, as bolhas também ajudam a rezar. Sim, não criar bolhas é ainda rezar. Os montes e ribeiros, as searas e os passarinhos, as gentes e os automóveis, os caminhos, as estradas, o calor e o frio, o silêncio e o ruído, o nascer e o pôr do sol são rezar, ajudam a rezar.
Quando vamos alegres, cantamos; quando vamos cansados, rezamos. Sei de quem para vencer a dureza do caminho reza. Sei de quem rezou e chegou ao fim sem perceber. A oração adianta o caminho e apressa as horas, ou retarda o tempo aos que vão frescos e gostam de caminhar. A oração é como o paladar. Sim rezamos, que para isto é a oração: para que nasçam mais obras, mais ânimo para o caminho.

CRONICAZ de um Perigri, letra N





NUNO
(Vai perdoar-nos que chamemos assim, simplesmente Nuno!) Dele se pode dizer o que os Evangelhos dizem da Virgem Maria: «Guarda tudo no seu coração». Este ano falou um poucochinho mais. Já há apostas: a que mais votos leva diz que é por ter vindo visitar-nos ao AAAcampáki.


CRONICAZ de um Perigri, letra M




MADRINHA
Só temos uma. Não queremos outra. É sábia, é espiritual. É simples, disponível, Carmelita, enfim. Nela se cumpre o Evangelho. Muitas palavras do Evangelho lhe caem bem. Tantas medita, que, quem por ela passa, algo de bondoso pode colher nem que seja um singelo copo de água fresca.
Ela que já não é nova a mim me contou que no fim lhe tocou o melhor vinho, como em Caná da Galileia. Se assim é e se o bom vinho é o Carmo Jovem, deixe que lhe diga: ó responsabilidade que acaba de nos lançar para os ombros!
As raparigas dizem que se dorme bem em casa da Madrinha. Não duvido. Ao que depois elas caminham!
Estou certo que o exemplo move. O seu exemplo de mulher toca as nossas mulheres e a mim também.

MARGARIDA E INÊS
São o futuro. Uma é Marta, outra Maria. Uma contemplativa, outra activa. São meninas de nove e onze anos. A Gotinha tem futuro. Já vestiram a camisola e levaram a faixa para casa. Já querem saber quando serão convocadas de novo. Sê-lo-ão, sê-lo-ão. Queremos que venham, precisamos que venham. Agora que trazem a Gotinha no coração, queremos que aprendam a carminhar connosco.



MARIA
É para a casa dela que caminhamos, é à escola dela que vamos. Porque sabemos que a Mãe nos quer ele para nos levar ao Pai.
E o regresso diz bem aonde acabamos de chegar, donde acabamos de zarpar.

quarta-feira, 23 de junho de 2010

CRONICAZ de um Perigri, letra L



LIXO
É uma das presenças mais presentes no caminho dos peregrinos. É impressionante o lixo que os próprios fazem. Somos um lixo de país. Eu também contribuí com uma tampinha que me caiu na subida de Santa Catarina. Não a apanhei porque não pude, julguei que morria e não quis atrapalhar quem comigo caminhava. Penitencio-me por isso. São os tais erros ou defeitos que todos temos.
A verdade é que o caminho cheio de plásticos velhos é muito feio. Não ajuda nada a carminhar. Não se passou isso connosco. No fundo do carro do António Branco estavam todas as garrafas que bebemos, e na carrinha do Zé todas as tampinhas (as garrafas punha-as ele zelosamente nos plasticões).
A peregrinação tem de ser completa. Para quando uma peregrinação da beleza que não fira nem suje a natureza?






LÚCIA, IRMÃ
Quem diria? Gosta mesmo de nós. Não perde uma para caminhar connosco. Quanto lhe agradecemos! O Carmo Jovem também gosta muito dela. E então, desde que ela se deixou fotografar com o nosso lenço e o nosso pin, ainda mais!
Sabedora da nossa Peregri, fez-se presente com uma Carta que o Carmelo de Coimbra delicadamente nos escreveu. Foi uma carta bem longa que escutamos em silêncio. Por ser tão longa não foi logo bem digerida, mas vamos dá-la a todos para que todos a leiam e re-escutem a mensagem e lhes custe menos o carminhar.
Muito obrigado, Irmã Lúcia.


CRONICAZ de um Perigri, letra G




GOTINHA
O Carmo Jovem é uma pequena Gotinha no oceano. Sabemos isso e não é isso que nos assusta. Somos tão pequeninos que os primeiros raios de luz do dia nos secam como se seca o orvalho da manhã. Mas depois reverdecemos, vem a noite e ressurgimos. Refrescamo-nos. E eis-nos a caminho. Em quinze anos de história já vi a Gotinha renascer muitas vezes. E em Fátima ela renasceu mais uma vez. Mais uma vez me alegrei. O bom Deus ama a Gotinha e por isso a renova e com ela as nossas forças.
Mais uma vez eu vi a Gotinha renascer. A crescer.


terça-feira, 22 de junho de 2010

CRONICAZ de um Perigri, letra F




FAIXA
A faixa do Carmo Jovem é inseparável do look dos peregris. Não é que seja grande coisa, é um sinalzinho que nos identifica. Caminhemos à frente ou atrás, separados ou em conjunto, somos Carmo Jovem. É entregue na Bênção do Peregrino e deve ser guardada e defendida não só durante mas também depois da peregrinação. Bem à vista ela fala o que somos. Somos gente com coração que ama o Carmo em Movimento. A faixa diz isso e mais, e é verdade. É verdade que há movimento: muito de pés, mas muito mais no interior.
A Beatriz também recebeu uma, mas já reclamou uma faixa mesmo, não um lençol. A ver vamos.



FAMÍLIA
Deve ser do caminho ou então das dores. O caminho distende-nos, mas não nos separa. As dores doem-nos e todos se condoem. O caminho é duro, mas é sempre menos duro para alguém que tem uma réstia de força para ajudar os mais fracos ou desanimados. Somos uma família. Há algo que nos une. O António Branco é o mais velho do plantel. Tem filhos entre os peregrinos e até uma neta. No fim, ele diz sem vergonha que para onde olha vê um filho e que os não distingue. Os da casa não são menos que os de fora. Somos todos filhos, somos todos família. É isso que se sente, é este calor que conforta, cura e anima. É esta a marca do Carmo Jovem, e tanto assim é que não se esqueceram os ausentes, os que não puderam vir, os que tomaram outro rumo, os que nos foram encomendados. E por uns dias os laços apertaram ainda mais.

segunda-feira, 21 de junho de 2010

CRONICAZ de um Perigri, letra E


ERROS Há erros há. Como em tudo que mete homem ou mulher. Uns custam mais que outros, mas ainda assim são raros; ou melhor foram raros nesta peregrinação. Ninguém está isento deles, é claro. Mas tudo se perdoa com um abraço ou um sorriso. Tudo se esquece, porque o importante é chegar ao fim. Na próxima peregrinação só quero quem erre, porque os que não erram são anjos e andam a voar…



ESPIGA
Junho é o mês das searas. Bonito foi vê-las sobretudo dum lado e outro da Estrada da Guia. Muitas estavam já colhidas, as restantes loiras. Como iniciámos a Peregrinação em dia do Corpo de Deus a cada um de nós foi-nos entregue um espiga. Tinha uma particularidade: não tinha grão. E tinha um objectivo: depô-la aos pés da Mãe. Se não tinha grão ficou-nos uma intenção: cuidá-la e chegar com ela ao Santuário, deixá-la simbolicamente em nome de cada um, e visto que grão não tinha todos desejávamos que a nossa vida se enchesse, a fim de que vazia não a depuséssemos junto da Mãe. E assim foi. E assim se fez.



ESPÍRITO SANTO
Ao longo do Ano as nossas actividades sempre foram patrocinadas por um sacerdote já canonizado ou em vias, e sempre fomos rezando pelo do lugar. Quem nos deu a frase para a quarta Peregri foi o Ven. Eugénio Maria do Menino Jesus, Carmelita Descalço francês, falecido na década de sessenta do século passado. Escreveu ele: «O Espírito Santo alegra-se de estar connosco», o que em linguajar se lê: «O Espírito Santo alegra-se de carminhar connosco». E estava dito. E de facto o Espírito Santo andou sempre connosco, e tanto andou que sempre chegámos com mais duma hora de antecedência às respectivas metas. É caso para dizer: o Espírito Santo dá-te asas. E é que dá mesmo!

EUGÉNIO MARIA
O Venerável Eugénio Maria do Menino Jesus, sacerdote carmelita francês, 1894 – 1967, foi o padroeiro da nossa peregrinação. Pouco conhecido em Portugal já ouvi dizer que é um grande santo. Pois é, eu sei. Conheceu o Carmo e a ele se entregou depois de ler São João da Cruz. Viveu entregue à graça de Deus. E ensinou a viver só para Deus, totalmente aberto a Deus. Foi bem escolhido como modelo de confiança.




«EU QUERO O ABSOLUTO.»
Esta foi a frase inspiradora do terceiro dia da nossa peregrinação. É do Venerável Eugénio Maria. Ser peregrino é isso: não lhe chegar o quotidiano, o habitual. Querer o Absoluto obriga a sair de si e da sua família, obriga a abrir para Deus, o único absoluto que sacia a sede de quem ousa ter mais sede que a sede dos dias habituais. Eu quero, nós queremos o Absoluto e nada menos que o Absoluto nos consola!


CRONICAZ de um Perigri, letra D



DEPOIS
Depois recomeçamos. É o regresso ao quotidiano. É como colocar as peças no tabuleiro. No caso de alguns é começar a pensar na organização da próxima. Na cabeça de todos é já buscar um buraquinho de tempo e de sensibilidade para continuar a peregrinar. Depois? Depois é tempo de não se desistir de se ser peregrino, humilde peregrino.



DESISTÊNCIAS
Não houve. O que é uma alegria. Todos chegámos. E em primeiro! Conta-se, porém, a história de certo peregrino do Carmo Jovem que passou pelo carro. E quando o digníssimo traseiro se encontrava já bem refastelado, o nosso cronista Fernão Lopes registou em sua crónica: «Fulano de tal desistiu!» E o pobre ao ver-se perpetuado na história como um frraquinho logo saltou do veículo, que, ao que parece, nem chegou a suster a marcha convenientemente. E recomeçou a marcha. Porém, ainda assim faltou ao assustado peregrino ir da Rotunda Norte à Rotunda Sul, para completar o caminho que andou de boleia! Fica para o ano.



DESPEDIDA
A despedida é sempre o mais difícil. Durante quatro dias o caminho da peregrinação gera dores e afeições que se nos colam à alma e que tardam ou jamais desaparecem. Nascem ali uns laços que laçam como se fossemos família. Por isso tanto custam a deslaçar. Deve ser assim em todos os grupos. Mas no Carmo Jovem não deve, é mesmo! A despedida é sempre tão longa, tão longa como uma Missa do Frei João. É o que dizem!

sábado, 19 de junho de 2010

IV PERIGRI - Testemunho IV



Peregrinar sob o olhar de Deus e da Virgem Maria.


Como é bom chegar, ter certeza de um novo recomeçar.
Agora com algo mais, um sinal carregado de experiências vividas.
O caminho faz-se por Amor num Acreditar, onde se deve agradecer o chão que beijamos a cada passo.
Só descendo à nossa humildade carmelita de peregrinos é que conseguimos valorizar e contemplar as coisas mais simples e belas da vida. Sim, porque só o Amor consegue ver que “para subirmos temos que descer e descendo é que conseguimos subir” !
Quero agradecer nesta peregrinação a honra que nos foi concebida, no dia do Corpo de Deus, de poder andar e deixarmo-nos levar por Ele, como bem lembrou o João Carlos, não somos nós que O levamos, é Ele que nos leva !
Também é motivo de especial referência a presença sempre em comunhão das nossas Irmãs Carmelitas, que andaram, rezaram e partilharam todos os momentos desta nossa peregrinação. Sempre bem visíveis na Cruz e na faixa com os seus nomes e dizeres, que transportamos com muito carinho, respeito e Amor, por onde quer que andássemos. Durante a peregrinação, algumas pessoas perguntaram se a Cruz não era pesada, se não estava cansado de a carregar sempre na mesma posição.
Respondi que todos temos uma Cruz para transportar, umas mais pesadas do que outras. Aprendi que a nossa Cruz é sempre mais leve quando ajudamos alguém a carregar a sua Cruz !
Depois de chegarmos a Fátima o descanso merecido estava à nossa espera, mas não consegui ficar quieto, algo me chamava…
Tive que ir ao Santuário, comecei na Capelinha das Aparições. Depois fui à Basílica onde estive também pouco tempo. Havia algo que me puxava, não era ali que queria estar. Ao sair, senti então a força do íman, caminhei pausadamente pelo recinto, sempre a olha-Lo…
Cheguei, coloquei-me debaixo, encostei a minha mão e olhei para cima, o céu estava azul com algumas nuvens a correrem, o que me deu a sensação que Cristo no alto da sua Cruz rodou e olhou para baixo ! Ali estava eu, tão pequeno, senti-me uma gotinha infinitamente pequena a contemplar… a insignificância que somos perante algo tão grandioso !
Chorei…
Fiquei preenchido por Ele !
Uma peregrinação serve para darmo-nos conta que sem Ele, nada somos e nada valemos, é Ele que a cada passo nos encoraja e enche de Amor. Nos faz Acreditar que somos capazes de enfrentar o caminho de cabeça erguida, de estender o nosso sorriso e a nossa mão ao nosso irmão que caminha connosco. De levarmos no coração aqueles que nos acompanham em oração. De nos deixarmos carregar nos momentos mais difíceis.

Obrigado meu Deus !

P.s. – A Madre superiora Maria Emília da Imaculada Conceição, do Carmelo de Coimbra, disse-me que estariam sempre connosco nas suas orações e que a Irmã Lúcia também nos iria acompanhar. Foi verdade, pude senti-lo na carta que escreveram em seu nome, com alguns pensamentos e orações que ela teve. E foi ainda mais intenso em sua casa, mais precisamente no poço do Arneiro onde o Anjo apareceu pela 2ª vez a ensinar os pastorinhos a rezar. Estavam duas lindas meninas que connosco rezaram sentadinhas em cima do poço, foi depois de rezar a oração final que a Cruz Carmelita que esteve sempre calmamente encostada ao Anjo, balançou e caiu. Um sopro forte foi o seu causador, para mim, mais um sinal da sua presença entre nós, como que a dizer que estava Feliz por estarmos a rezar…

Ide em Paz, caminhai para Deus. “Não tenhais medo de entregar tudo ao Tudo”.

Tony, Coimbra

DOMINGO XII DO TEMPO COMUM

Um dia, Jesus orava sozinho, estando com Ele apenas os discípulos. Então perguntou-lhes: «Quem dizem as multidões que Eu sou?». Eles responderam: «Uns, dizem que és João Baptista; outros, que és Elias; e outros, que és um dos antigos profetas que ressuscitou». Disse-lhes Jesus: «E vós, quem dizeis que Eu sou?». Pedro tomou a palavra e respondeu: «És o Messias de Deus». Ele, porém, proibiu-lhes severamente de o dizerem fosse a quem fosse e acrescentou: «O Filho do homem tem de sofrer muito, ser rejeitado pelos anciãos, pelos príncipes dos sacerdotes e pelos escribas; tem de ser morto e ressuscitar ao terceiro dia». Depois, dirigindo-Se a todos, disse: «Se alguém quiser vir comigo, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz todos os dias e siga-Me. Pois quem quiser salvar a sua vida, há-de perdê-la; mas quem perder a sua vida por minha causa, salvá-la-á». [Lc 9, 18-24]

sexta-feira, 18 de junho de 2010

CRONICAZ de uma Perigri, letra C




CAMINHO
O caminho é o que nos leva, como é óbvio. Ele já lá está quando chegamos, ele por lá fica quando o calcamos e avançamos. Nada de novo aí.
O Caminho de Aveiro, chamemos-lhe assim, é aquele que percorremos. Na grande maioria seguimos a berma da Nacional 109. Se nuns sítios ela é generosa e larga, noutros é estreita e facilita o convívio com o trânsito. O trânsito é um desafio a juntar aos desafios do caminho. Um heroísmo a juntar ao da decisão de peregrinar.
Não sei o que goste mais, se das rectas se das curvas. Se das descidas, se das subidas. Parece-me que das subidas e das rectas. As subidas são sem dúvida o melhor caminho de se fazer. Sobe-se melhor do que se desce. Mas é óbvio, depois do Barracão tanto se desce que tarde ou cedo teremos de subir. E por isso lá está a longa subida de S. Catarina para nos testar a força dos motores.
Dizem que a maior das rectas da Tocha tem 22 Km. Talvez seja. Tanta lonjura assusta: parece que nunca acaba, mas acaba. É preciso coragem e seguir em frente. O Norte ainda não tem um caminho demarcado que afaste os peregrinos das bermas das estradas. Mas já merecíamos um caminho demarcado e cuidado, que nos tirasse de tantos riscos e que nos animasse a andar ainda mais.

CAMIÕES
Os camiões são uns campeões: são os nossos com companheiros mais presentes, nunca nos largam. Já agora: Sabe o que mais faz um camionista quando conduz: fala ao telemóvel! Aquilo, de facto, parece que não é difícil de conduzir, por isso eles falam tanto ao telefone. Vai daí quando se cruzam com os peregrinos raramente se desviam. A estrada é deles, a berma é nossa. Mas é muito fácil que eles invadam o que é nosso e façam valer o estatuto. Por isso, o melhor é ir atento ao monte e à moita, porque o mais certo é termos de saltar para lá.
E quando se caminha em silêncio, concentrado, talvez até rezando, ou numa meditação qualquer quer seja, uma que seja, sobre a vida ou as árvores, ou o que seja, pronto, chega de mansinho um camião e descarrega-te uma apitadela, que, se ainda não saltaste, é desta que saltas para as silvas!
E pronto, enquanto não nos derem um caminho do peregrino como deve ser, todas as Peregris vão ser sempre difíceis e muito arriscadas.


CONDUTORES Os condutores são imprescindíveis numa peregrinação. São eles que levam os carros de apoio. Um carro de apoio faz muitas coisas: leva água, sumos e fruta, uma pequena farmácia, colchões e mochilas, guiões e prendas, chocolate, alegria e ânimo, bolachas e bolachinhas para incendiar o último sopro de caminho. Recolhe um desalentado e responde às emergências. Por isso, os condutores são um pouco de tudo: aguadeiros e enfermeiros, carregadores e animadores, vendedores de banha da cobra. Os heróis são mesmo os que carminham a pé, mas caminha-se melhor sabendo que os anjos andam por ali. Por isso, os nossos parabéns e reconhecimento ao António Branco e ao Zé Henriques! Foram inexcedíveis.



CRUZ
Cada um tem a sua e nem sempre sabe levá-la. E também há quem levando a sua leve outras. Foi o caso do Tony. Carregou a sua e carregou uma que o Carmelo de S. Teresa lhe confiou. Carregou-a de Coimbra a Aveiro, de Aveiro a Mira, de Mira a Fátima. Normalmente o lugar da Cruz é à frente, desta feita foi atrás: era como uma luz que se projectava mostrando-nos o caminho, dizendo-nos onde haveríamos de por os pés. O Tony é um atleta, e como tal coube-lhe a tarefa de fechar a procissão. Fê-lo com agrado, com dignidade e saber. Ficamos muito mais dignos com a sua vivência e atitude.
Se as cruzes falassem saberíamos o que moveu cada um, mas não falaram. Mas sabemos o que disse o Tony, que «quando carregamos as cruzes dos outros as nossas ficam muito pequeninas!» Acredito que sim, sei que sim. É uma graça poder carregar a Cruz, ainda mais se ela é dos outros.
Ressalte-se ainda a grande dignidade — que todos podemos testemunhar — na maneira como o Tony a transportou: sempre na mão direita, sempre ao alto como se fora levezinha. Tiro-lhe o chapéu!
Existem também muitas cruzes nos caminhos. Embora bem menos que no verde Minho. Algumas assinalam tragédias, outras esconjuram o mau olhado da beira da porta, outras ainda assinalam a fé do nosso povo. Hoje já quase não se erguem cruzes novas de pedra, mas as que lá estão são suficientes. Assinalam a fé, pautam a nossa marcha, recordam-nos que ou por lá passamos ou passamos por lá. É esse o nosso caminho. Assim seja, assim o faremos.

quinta-feira, 17 de junho de 2010

IV PERIGRI - Testemunho III

Ele ressuscitou ao terceiro dia, ao terceiro dia, também, chegamos á Mãe.

E assim foi, no terceiro dia, a caminhar com o Ele para a Mãe chegámos a Fátima.

Foram dias com muita alegria, boa disposição, algumas bolhas e acima de tudo muita Oração.

No primeiro dia, como costumo dizer, foi o dia para preparar o físico e o espírito para os dois restantes.

Tentei carregar Cristo, nos meus 30 minutos de “Direito de Antena” que tinha com Ele, que acabou por ser cerca de 3 horas, mas efectivamente foi Ele que me carregou, e me deu energia para os dias seguintes.

Falei com Ele, sobre quem sou, que Ele já bem me conhece! Mas falei com Ele mais sobre a minha Família: meus pais, irmãs, cunhados e acima de tudo para o novo elemento da minha família, a Beatriz - a minha sobrinha de dois meses.

No final do primeiro dia, o meu balanço foi positivo: poucas dores musculares, muita boa disposição e algum sono pelas poucas horas dormidas no dia anterior...

Um segundo dia, com a Oração num lugar original, parecia que estávamos num coreto, seguida de um café com efeito revitalizante anti-sono...

E lá partimos para a segunda etapa rumo à Mãe.

Neste dia, aproveitei para pensar nas pessoas que me são próximas. Logo após a partida pensei num casal amigo, muito próximo, ao qual enviei a seguinte mensagem: “Hoje na caminhada estou a pensar nas famílias. Desejo para a vossa (M. e E.) sejam felizes. Beijos e Abraços”.

Nunca pensei que a minha mensagem fizesse a M. chorar, porque só queria demonstrar o carinho que tinha por ela, por estar a passar alguns problemas familiares, por isso, renovo o meu pedido: “Quero que sejas feliz...”. Desculpa o efeito que a minha mensagem inicial teve em ti...

Aproveitei ainda para conversar com o meu NOVO amigo, sobre o Carmo e sobre a sua opção de entrar para a Ordem, sobre o que o movia, sobre Ele... Força Carlos, apoio-te sem qualquer restrição e fica combinado que um dia vou a Avessadas para tomarmos um café e para conhecer o Santuário do Menino Jesus de Praga.

Durante a nossa estadia no Centro Comunitário da Ilha, durante a Oração, coube a mim dar a resposta. Acedi com alegria, porque uma Peregrinação faz-se em comunidade, por isso partilhei um momento que se passou comigo:

“Quando caminhava e se aproximavam os camiões era impedido de andar em frente ou, por vezes, retardavam o meu passo vigorante, lembrei-me dos problemas que todos temos no nosso dia-a-dia, porque pensei nesses monstros da estrada como se fossem obstáculos na estrada da vida”

Que todos nós e nossos familiares nos levantemos e lutemos contra os obstáculos que encontramos no caminho da vida...

Estávamos a algumas horas de chegar à Mãe, a cerca de 5 pensava eu, que viriam a ser só 4 horas e 20 minutos...

Tive a sorte de receber da mão do Frei João, (Frei Bolhas), o cajado do Carmo Jovem, que me acompanhou durante quase todo o dia (literalmente – este símbolo só descansou quando chegou a Fátima).

Este cajado foi anunciando a minha passagem pelos outros grupos de peregrinos, com uma cadência certa e algumas vezes um pouco mais sonora amparando-me.

Como estava a caminhar afastado e á frente do restante grupo, fui aproveitando para pensar um pouco em mim, já que nos outros dias pensei mais nos outros...

Durante o último dia de caminhada, aconteceram-me dois episódios que me tocaram muito.

O 1.º momento marcante:

Quando caminhava, uma senhora perguntou, “Qual é a força que o move e o faz caminhar com tanto vigor? Será que pode dispensar-me alguma dessa energia?” A esta senhora, só respondi, que “neste cajado carrego a minha família (pais, irmãs, cunhados, Beatriz), Ana, pais e irmã da Ana, Ricardo e Raquel. São eles que me dão força para seguir em frente até Fátima.

E foi mesmo isso, até que a pessoa que chorou com a minha mensagem do 2.º dia de Peregrinação, telefonou a perguntar onde andava, eu respondi, “Faltam 4 km’s, serão por ti M. e pelo E., para que sejam felizes”, escusado dizer que o resto da conversa do outro lado do telemóvel, já era uma conversa melancólica com lágrimas a escorrerem pelas faces apesar da tentativa de disfarce para que não percebesse.

O 2.º momento marcante, foi quando após a “n” (n.º de vezes indeterminado) passagem por mim de um Volkswagen Preto, uma menina ou senhora (não sei), comentou “Andai sempre alegres” à qual retorqui, mostrando a mensagem da minha T-shirt “Alegrai-vos”. E assim andei, os poucos últimos km’s até à rotunda dos peregrinos.

Nos dois últimos km’s, olhava para trás, não para ver se estava ainda mais longe dos meus colegas, mas para ver se alguém andava por perto, porque gostaria de terminar aquela fase um pouco diferente dos dias anteriores, porque queria ter companhia, para além d’ Ele.

E assim foi, abrandei um pouco, a João e Carlos aceleraram e chegámos os três juntos de mão dada, em sinal de união, de amizade, de missão cumprida...

Um obrigado especial para a João, não como organizou este grupo, mas por uma vez mais (como no ano anterior) chegarmos os dois juntos...

Desta vez só tinha o meu pai na “meta”, ao qual dei um beijo, e que nos acompanhou sempre com a voz amiga e preocupada se necessitávamos de alguma coisa (bolacha, água, fruta ou algo mais...), e ao Zé um abraço de agradecimento que prestou o mesmo serviço de apoio.

Depois da tradicional entrada em grupo, unido pelo mesmo propósito, no Santuário e de termos estado cada um com a Cruz das Irmãs do Carmelo de Coimbra (que tratem e acolham bem a nossa Raquel), fomos almoçar para restabelecer energias para as nossas orações nocturnas no Santuário.

Pela primeira vez assisti ao terço (às 21:30 horas) no Santuário e seguidamente á Procissão das Velas (que só tinha visto através da televisão)...

Cada luzinha (vela) acesa, para mim considerei cada esperança que o seu portador tinha, e a minha vela tinha o mesmo significado.

Se houve alguma actividade que mais me tenha marcado a vida, esta foi a mais marcante.

Quatro dias de retiro do quotidiano da vida...

... onde pensei e pedi para mim, minha família e pessoas mais chegadas.

... onde tomei algumas decisões, espero eu acertadas.

... onde convivi com outros e dei mais de mim aos outros.

... onde tentei dar algumas mensagens de incentivo a outros peregrinos.

... onde falei com Ele a caminho da Mãe.

Obrigado Maria...

De 3 a 6 de Junho, caminhei com Ele e com um grupo especial para a Mãe.

Peço desculpa se me alonguei em demasia, mas foi o que consegui resumir dos meus pensamentos de 4 dias em comunidade, em grupo, em família…

Saudações Carmelitas.

Marco Branco - Aveiro

quarta-feira, 16 de junho de 2010

IV PERIGRI - Testemunho II



Olá Carmo Jovem, esta IV Peregri foi para mim a primeira, a primeira Peregri e a primeira peregrinação a pé. E desde já vos posso dizer que quero repetir a experiência, quero voltar a viver em comunidade “religiosa nómada”, porque no fundo foi isso que fizemos durante o tempo de peregrinação.
É certo que nenhum se consagrou devidamente a Deus (excepto os Freis João e Marco), mas o coração, esse sim foi consagrado ao Senhor durante este tempo de peregrinação. Consagrámos o nosso coração a Deus da seguinte forma: a carminhar para Ele, levando-O a tiracolo, deixando que Ele nos carregasse ao colo nos momentos mais difíceis e amando próximo como a nós mesmos.
Fazer uma peregrinação assim não custa, porque quando me sentia mais em baixo, havia sempre um bom cireneu pronto para me ajudar a levar a minha cruz. Por isso posso dizer que agradeço ao Senhor as minhas bolhas e as minhas dores porque assim, no sofrimento, fiz grandes amizades que me irão acompanhar por todo o sempre. Estou certo que Ele me deu essas amizades de bom grado e que não me irá tirá-las, porque as pôs no meu caminho como quem põe almofadas no caminho do amado para que ele não magoe os pés. Com tantos carinhos que Ele me proporcionou, nunca tive a tentação de desistir nesta peregri. Tenho como certo que a Mãe muito intercedeu por mim junto do Senhor.
A espiga, que me foi entregue e da qual fui encarregue de fazer chegar ao santuário de Fátima, para mim foi símbolo daquilo que Deus vai fazendo na vida de cada um de nós, isto é, a minha espiga chegou ao Santuário sem uma parte do caule e com outra quase a soltar-se. Digo que a espiga foi símbolo da obra de Deus em cada um nós porque Ele vai retirando em cada um o que está a mais e vai-nos moldando para que alcancemos o tamanho e a forma certos para entrar no Seu reino. Por outro lado, posso dizer que a espiga era símbolo da cruz que carreguei durante a peregrinação, o cajado é um sinal mais evidente dessa cruz pelo seu peso, mas a espiga que esteve encarregue a mim todo o tempo era mais simbólica desse peso que todos aceitámos carregar ao seguir a Cristo.
A vontade de largar a preocupação da espiga surgiu, tal como na vida nos surge a tentação de largar a cruz, para mim não passou de uma tentação, de facto larguei a minha espiga e coloquei-a durante uma parte do percurso na carrinha, mas depressa me apercebi que era eu quem tinha que levar a cruz e não tornar a cruz do meu próximo ainda mais pesada. O bom cireneu nunca se recusou em socorrer-me e em transportar a cruz por mim.
Por falar em bom cireneu, foi muito bom ver como a cruz de cada um se ia tornando cada vez mais leve à medida que nos íamos conhecendo e entrando em comunhão cada vez mais perfeita. Posso dizer que durante a peregrinação nos fomos tornando uma família bastante unida em que cada um respeitava o seu próximo e sabia quando é que devia ajudá-lo a suportar a sua cruz.
Por vezes, pergunto-me: porque é que será que não olhámos mais para o Evangelho e não tomámos a Cristo por exemplo de imitação obrigatória? A Palavra de Deus é um manual de vida em Amor, como é possível haja tanta gente que ainda não percebeu? O “Frei Bolhas” dizia na homilia da Eucaristia de quinta-feira de Corpo de Deus, que o Pão e o Vinho são um excelente exemplo da verdadeira comunhão, a cada um, como grão ou como uva que era, foi sendo retirado o farelo ou o cangaço, para poder chegar ao Pão e ao Vinho que tanto delicia ao Senhor, ou seja cada um como unidade passa por grandes sofrimentos e transformações para poder chegar ao amor verdadeiro, que se encontra na verdadeira comunhão com Cristo e com todo o povo de Deus. O caminho foi feito de obstáculos que cada um foi transpondo ao seu ritmo, e todos perceberam que a alegria vem depois da cruz, sem o sofrimento nunca conseguiríamos dar valor à verdadeira felicidade. No entanto, posso dizer que fui muito feliz enquanto transportava a minha cruz. Por isso digo que a alegria também está no caminho, basta olhar para ela com olhos de ver.
Na primeira etapa do caminho cada um de nós pode transportar Cristo consigo e falar com Ele, neste tempo muito Lhe pedi e muito Ele me deu, do leque de graças que Ele me concedeu posso dizer que me deu a entender que não era eu que o carregava mas sim Ele que me levava ao colo.
No impulso do agora podemos muito bem deixar-nos tomar pela tristeza, mas não nos esqueçamos que Ele ressuscitou três dias após a morte, morte que ofereceu ao Pai em troca da nossa absolvição, por isso alegremo-nos mesmo que Cristo ainda não tenha ressuscitado na nossa vida, Ele prometeu que iria ressuscitar para salvar o mundo (“descida da cruz”).

João Carlos
Rosém

terça-feira, 15 de junho de 2010

CRONICAZ de uma Perigri, letra B

Beatriz

A Beatriz é pequenina. É um bebé de quase dois meses. É filha do Pedro e da Susana, ambos do Carmo Jovem. São um casal com o Carmo no coração. Há outros casais, namorados e noivos. Eles são casal e família. A Beatriz escreveu a biografia do Venerável Eugénio Maria do Menino Jesus, que inspirou e protegeu a nossa peregrinação. E depois recebeu também ela uma faixa do Carmo Jovem, porque no seu pequenino coração vive o amor que ama o Carmo. E o Carmo Jovem ama a Beatriz. Na Eucaristia do fim da peregrinação recebeu a imposição do Escapulário do Carmo, porque Nossa Senhora a ama muito e como ao Menino Jesus a protege de todos os perigos.

Tão pequenina e já peregrina. É isso que somos quando vimos ao mundo: peregrinos do Alto

Bênção do peregrino

Foi em Aveiro, no Carmo. Por questões de poupança foi o lugar escolhido para a concentração, apresentação e bênção dos peregrinos. Estávamos todos, menos os que tendo de trabalhar só caminharam um ou dois dias.

O momento foi simples, sentido e demorado. A Irmã Lúcia mandou uma carta aos jovens via Carmelo de Coimbra. E a Raquel mandou outra muito sentida. E uma carta dela é uma carta dela: pronta a ser escutada em silêncio. E foi.

Finda a carta recolhemos ao chão dos quartos. (A mim coube-me o chão da sacristia e não foi das noites mais mal dormidas!)

Estamos agradecidos à Comunidade pelo acolhimento.

Bolhas

Ah! As bolhas! Como são belas as bolhas. Nem todos as fazem nos pés, mas alguns cristos não lhes escapam! Duas ou três bolhas por jornada é o meu salário. Primeiro é um sinalzinho. Depois o roce vai aumentando. Depois um pique e uma dorzita. Por fim parece que todo o pé está empapado de bolhas. Não está, impossível que esteja. Mas o incómodo da sensação faz crer que sim.

Alguns peregrinos são tão perfeitos que o caminho nem a prenda das bolhas lhes dá! Valha-me Deus, que a mim sempre me consola com muitas. E este ano mais que nos outros.

Se tirarmos os imprevistos, a sessão do fura-bolhas é a mais cómica de quantas sucedem numa Peregri. Eu não perco uma, e também dou os pés para o sacrifício.

Se os há que a si próprios se furam e se curam, outros peregrinos recorrem à bondade alheia. Não há especialistas pelo meio, mas sensibilidades. Por exemplo, existem «As Bolhas de Fátima»: acredite quem quiser. As Bolhas de Fátima são tratadas e curadas duma maneira diferentemente das demais.

O truque é furar, esvaziar e meter lá dentro betadine. O resto cura com o descanso e o (pouco) sono.

(É certo que há quem recomende não furar a bolha; mas eu não sei como se poderá caminhar no dia seguinte — embora já o tenha visto fazer!)