sábado, 31 de maio de 2008

Aprendo a rezar com os pés

Caminham em filas ao lado das estradas nacionais, por trilhos de terra batida, atravessando pequenos povoados que antes desconheciam, cruzando horas e horas a paisagem de giestas e silêncio. Têm em português um nome que deriva de uma forma latina: Per ager, que significa “através dos campos”; ou Per eger, “para lá das fronteiras”. Definem-se, assim, por uma extraterritorialidade simbólica que os faz, momentaneamente, viver sem cidade e sem morada. Experimentam uma espécie de nomadismo: não se demoram em parte alguma, comem ao sabor da própria jornada, dormem aqui e ali. Num tempo ferozmente cioso da produção e do consumo, eles são um elogio da frugalidade e do dom. Relativizam a prisão de comodismos, necessidades, fatalismos e desculpas. E o seu coração abre-se à revelação de um sentido maior. A verdade é que é difícil ter uma vida interior de qualidade, se nem vida se tem, no atropelo de um quotidiano que devora tudo. Na saturação das imagens que nos são impostas, vamos perdendo a capacidade de ver. No excesso de informação e de palavra, esquecemos a arte de ouvir e comunicar vida. Damos por nós, e há, à nossa volta, um deserto sem resposta que cresce. E quando nos voltamos para Deus, parece que não sabemos rezar. Estes peregrinos que tornam a encher as estradas de Fátima (mas também de Santiago, de Chartres, do Loreto…) assinalam-nos o dever de buscar a estrada luminosa da própria vida. Já não separam a existência por gavetas estanques, mas o seu corpo e a sua alma respiram em uníssono. A oração torna-se natural como uma conversa, e as conversas enchem-se de profundidade, de atenção, de sorrisos. A parte mais importante dos quilómetros que percorrem não está em nenhum mapa: eles caminham para um centro invisível onde pode acontecer o encontro e o renascimento. Queria dedicar este texto a um amigo que, neste mês de Maio, fez a sua primeira peregrinação. A meio do caminho enviou-me uma mensagem a dizer: «Aprendo a rezar com os pés».
Pe José Tolentino Mendonça

sexta-feira, 30 de maio de 2008

Carta do Papa ao Carmo Jovem

O Carmo Jovem escreveu ao Papa. E o Papa escreveu ao Carmo Jovem. O pessoal das carminhadas já conhece a Carta pois foi lida no Carmo de Braga, no dia 24 de Maio. Melhor, foi lida em suspense, ouvida com sorrisos, saudada com palmas.
É uma bonita surpresa que queremos partilhar convosco. Alegremente.
O Papa sugere-nos a leitura diária duma página do Evangelho, que depois a oremos e meditemos procurando que a palavra se faça vida em nós. Mas há mais para ler, basta clicar.



Sagrado Coração de Jesus

IRRADIAÇÃO do AMOR

Oh Jesus,
une o nosso pobre coração ao Teu
para acolhermos a benevolência que vem de Ti,
pelo poder do Espírito Santo.

Inunda-nos e manifesta-Te sempre mais abundante em nós!

Intimamente nos unimos a Ti!


Em Teu coração misericordioso e repleto de bondade
não armazenaremos sentimentos egoístas,
amar-te-emos sem reservas.

Junto a Ti,

silenciamos, amamos,
absorvemos a Tua vida na nossa
e jamais poderemos duvidar desta divina realidade.

O Teu coração amoroso é a tua essência,
todo o movimento intrínseco no seio trinitário
é pura obra de amor que jamais vacilará.

Oh Jesus,
de coração infinito e eterno,
continua a procurar-nos e a inquietar-nos
até nos tornarmos só Teus…

Crava o Teu amor em nós…
e alicerça as paredes da nossa casa com a força da Tua presença.

Sentindo esta exigência,
esta força divina,
permaneceremos no sacrário
onde nos presenteais com o banquete de amor,
unindo o nosso coração ao Teu.

Oh Jesus,
no mais profundo silêncio quando Te encontrarmos em nós
que a nossa vida seja um eco da paz do Teu Calvário…

Que as gotas de amor que deixas-Te escorrer em Ti
possam saciar hoje a impaciência dos nossos corações!

Refugias-nos em Ti.
Necessitamos da abundância da Tua verdadeira graça.

Continua a derramar sobre nós o Teu amor incarnado,
humilde sem limites.
Nesta humildade,
continuaremos a ver a plenitude no Teu amor.

É do teu coração que precisamos para nos deliciarmos,
É da Tua festividade de Vida que necessitamos para
revigorar a nossa.

Identifica-nos com
os sentimentos da Tua Igreja.

Que alegremente em Teu palácio nos descubramos
e nele nos refugiemos,
vivendo a vida
animados pela força salvífica do Espírito Santo
seremos testemunhas do Teu imenso Amor!

Oh Jesus,
em Teu coração moraremos,

o Teu olhar repousa sobre nós!

Seguir-te-emos dia e noite…
é indiferente que desçamos
à profundidade do mar ou que subamos
às alturas das estrelas em noites escuras de sentido! …

A nossa fé em Teu coração não vacilará.

Oh Jesus,
em Teu coração sagrado
o nosso coração depositado
amará eternamente a
verdadeira fonte onde nasce e encerra a Vida: o Amor!

Eterna fonte sempre nova!

terça-feira, 27 de maio de 2008

II Acampaki




Mais valia

Por hábito não publicamos a correspondência privada do Movimento, só aquela que as pessoas desejam livremente postar. Mas a 'conversa' com a Márcia foi tão interessante para nós como para ela. Julgamos que pode edificar a outros como nos edificou a nós. Ainda que am edo e com alguma reserva aqui ficam as palavras da Márcia:
Olá Ricardo!

Muito obrigada por me responderes.
Claro que sou uma mais valia para o grupo ( mas isso dá para ver na foto que vos mando - sempre bem disposta).

Agora a sério... Acho que pertenço mais ao grupo dos "estorvos e empatas" do que ao das "mais valias". Tenho medo de não conseguir ter a vossa pedalada. ( A sinceridade também conta como uma mais valia, não é? E além disso depois não podem dizer que não vos avisei.)

Tocar viola?! Ora bem... toquei durante uns anos, mas depois... para ir aos casamentos tinha de deixar crescer as unhas para irem bonitas e não se conseguem fazer os acordes com unhas grandes e... está lá arrumada a um canto para tristeza dos meus pais que compraram a mais cara da loja. Mas posso levar se quiserem. Tenho duas. (desafinadas)
Mas sei bater palmas muito bem!!

Quanto aos compromissos pastorais,não sei muito bem o que isso é, por isso vou supor que sejam compromissos na paróquia. Sou leitora uma vez por mês na paróquia de Valongo do Vouga ( o padre de lá insistiu - porque eu lia muito bem e não podia deixar as minhas origens). Isto é só mais valias, afinal.

Ah!!! e fui escuteira durante muitos anos. (Também conta!!)

Bem... depois disto tudo e como não há mais perguntas é facil de concluir que mais valias é o que não falta.

Agora mesmo a sério. Compreendo que as inscrições acabaram e juro que não levo nem um bocadinho a mal que não possa ir. Até porque tenho mesmo medo de não conseguir acompanhar o grupo. Precisava era que me dessem uma resposta porque tenho coisas a decidir quer vá sózinha ou com vocês. E com vocês não faço a mais pequena ideia do que preciso levar.
Pode ser por mail (vejo todos os dias) ou por telemóvel.
Márcia Santos

Testemunho VII - II Peregrinação a Pé a Fátima

Carmo Jovem??! Jovens Leigos Carmelitas?!!
Não fazia a menor ideia do que era. Conhecia a Igreja do Carmo de Aveiro que fica a 800 metros de minha casa e onde apenas fui duas ou três vezes à missa. Mas lembro-me da decoração. Linda. Não havia flores. Apenas uvas, videiras, abóboras, hortaliça… "coisas da terra". Deve ser por causa dos frades – pensava eu. E era somente isto que eu conseguia associar ao nome "Carmo Jovem".

O Miguel (o meu marido) achava-me louca por querer ir com um grupo totalmente desconhecido. Não sei o que é melhor. Se ires sozinha ou com uma "seita" que não conheces de lado nenhum. Tu não bebas nada do que te derem. E telefona-me várias vezes ao dia.
No fundo, sentia-me mais assustada do que ele. Eram quatro dias e três noites. E com quem?!
Mas havia algo que me dizia que não era nenhuma "seita".Algo que me fazia acreditar. Algo como o "Testemunho III da Peregrinação a Fátima 2007" de um tal "José Henriques, 29 anos – Aveiro". Dizia tudo o que eu precisava que me dissessem. Sentiu um dia tudo o que eu estava a sentir. Tudo o que eu poderia vir a sentir se "embarcasse" com aquele grupo. E nada é por acaso. O Zé viria a ser a pessoa de todo o grupo com quem mais me identifiquei e das com quem menos falei. (Talvez porque não fossem precisas grandes palavras.)
Estava decidido! Vou!! (ou melhor, espero que me deixem ir)

" Chamo-me Márcia Santos, tenho 31 anos e moro em Aveiro." (…)
Parece estranho. Parece simples, mas foi assim que me aceitaram.
Aceitaram-me como uma "mais-valia", sabendo eu que não o era, desconfiando vocês de que nunca o seria.
Aceitaram-me porque era da "Geração 76". Obrigada Verónica.
Aceitaram-me porque numa "ditadura" quem manda é o "chefe" e ele já tinha decidido. Obrigada Frei João.
Aceitaram-me… porque existe alguém chamado Ricardo Luís. Obrigada.

Lembro-me do dia em que nos apresentámos.
Lembro-me de olhar para o Ricardo como quem tenta perceber se me meti em alguma alhada (e aquela cara não enganava ninguém), da expressão doce da Tuxana, do sorriso do Frei João quando, ao passar lá longe, me disse pela porta entreaberta: Olá Márcia. Sê bem-vinda. (lembrava-se do meu nome, mesmo sem nunca me ter visto)
Lembro-me de ver a Susana entrar (e o marido e o pai e a mãe e o irmão e a futura cunhada) e pensar: Aquela é a Susanita da Gafanha do Curso do Miguel (a Gafanhoa – como o Miguel carinhosamente lhe chama). Afinal isto não é nenhuma "seita". É a família da Susana. Ah!!, quando o Miguel souber!!...
E soube! E depressa se arrependeu de não poder vir também na dita "seita". (Que já tinha o tinha deixado de ser.)
Lembro-me do "Eu sou a/o ….. e vim a esta peregrinação porque….. e vou com a/o…… ( à nossa direita)."
A minha peregrinação era por agradecimento. Pela Maria (que não se chama simplesmente Maria só porque o nome é bonito ou está na moda), por todos os "milagres" do nosso dia-a-dia, por alguns "milagres" especiais, … pela vida.
Era por isto que peregrinava quando saí de Aveiro. Não foi por isto que peregrinei quando cheguei a Fátima. Tinha muito mais para agradecer.
Quanto à pessoa do meu lado direito, antes de chegar a minha vez de falar, tratei de lhe saber o nome: Delfina. Longe estava eu de imaginar o que seria para mim a Delfina nos 4 dias seguintes.
Sabem que mais… continuo a pedir a Deus que me dê a Fé necessária para acreditar em muitas coisas que todos vocês sabem que me "escapam" (não se escandalize Frei João), mas acredito que, nesse dia, a Delfina não estava sentada à minha direita por acaso.

E lá fui.
Soltei amarras… deixei-me ir.
Parti!

Como o José Henriques testemunhou, "no 1º dia era apenas um peregrino".
Não vou relatar o que me aconteceu nos 4 dias e 3 noites (pequenas noites) senão teríamos uma segunda crónica. Exteriormente, todos viram o que foi (e não foi só o que viram), interiormente… foi bem mais complicado.

O momento de "partilha e perdão" (3ª noite). O nº18 da Regra do Carmo: "No muito falar não falta o pecado". Agora aprendi. Agora até menciono a Regra aos meus alunos quando falam de mais nas aulas (não se escandalize Frei João). Mas também lhes digo que quando tiverem dúvidas devem pôr o dedo no ar e perguntar. Sem medo da pergunta parecer "tola" ou simples demais. Fiquei diferente depois da "partilha". Não consigo transcrever o que senti (ou não quero). Cada um de vós passou a ocupar um lugar ainda maior. O Frei João tem razão: "O sofrimento une".


Num instante, senti o mundo fugir-me debaixo dos pés.
Num instante, deixei de ver as estrelas no céu.
Num instante, deixei de existir como sendo eu mesma;
Passei a algo, uma coisa jogada ao acaso,
Que já não sabe no que há-de acreditar,
Que já não sabe o que sentir!
Depois, o mundo voltou.
Tal como as estrelas.
Mas já não era o mesmo mundo,
Nem as mesmas estrelas.
Também o que sentia já não era o mesmo.
Era mais forte.

Dos dias de peregrinação, mais não vos digo, porque nem tudo é para dizer.

Voltei para casa. O dia seguinte foi estranho. Continuava (ainda continuo) a peregrinar, mas sem sair do lugar. Sentia-vos ali perto de mim, sem o estarem. Dei graças diante da mesa posta, e almocei sozinha. Sabia que nada mais seria como antes. Afinal o Miguel tinha razão. Vocês deram-me mesmo alguma coisa para beber. E bebemos todos da mesma Fonte.

Ninguém fez o caminho que eu fiz, apesar de percorrermos a mesma estrada.
Ouvi-O, ouvi-vos e ouvi-me.
Caminhei In obsequio Iesu Christi.
Regressei por outro caminho. Ou talvez não. Talvez o caminho seja o mesmo. O que mudou foi a minha forma de caminhar.

A minha pedra ficou em Fátima. Está junto das vossas. "Somos UM".
Com ela ficou a minha peregrinação:

Por ti,
Para ti, MARIA.


Até sempre.
MÁRCIA SANTOS, 31 anos, Aveiro

Pais de Santa Teresa de Lisieux a caminho da beatificação

Os corpos dos pais da Santa Teresa de Lisieux, cujo processo de beatificação está em curso, foram ontem, dia 26, exumados, com vista a serem transladados para a Cripta da Basílica em Setembro.
Os corpos de Louis (1823-1894) e Zélie Martin (1831-1877), proclamados veneráveis em 1994, foram exumados das suas tumbas, situadas próximo da Basílica de Lisieux, durante uma cerimónia privado onde esteve presente Pietro, uma criança italiana de seis anos, miraculosamente curada graças à intercessão, segundo informação do Santuário.
A Congregação para as Causas dos Santos publicou um decreto, aprovado por Bento XVI, reconhecendo que os Martin viveram as virtudes da fé, da esperança e da caridade de forma heróica.
A cura presumivelmente milagrosa de Pietro está actualmente a ser examinada pelos especialistas da Congregação.
O aniversário dos 150 anos de casamento de Louis e Zélie Martin, assim como o avanço do processo de beatificação, são causa, segundo aponta o Santuário, para este desenvolvimento.
O anúncio da sua beatificação por Bento XVI pode acontecer a 13 de Julho, por ocasião da celebração dos 150 na os de matrimonio, em Alençon, vila natal da Santa Teresa.
Os restos mortais dos esposos serão colocados num relicário, ainda a ser feito em Verona, Itália, e o ar será substituído por um gás inerte, o argónio.
“Se Louis e Zélie Martin forem algum dia beatificados não será porque foram pais de uma santa, mas porque a sua vida é reconhecida pela Igreja”, explica o santuário. Até ao momento, apenas um casal italiano Luigi e Married Beltrame Quattro Occhi, foram objecto de uma beatificação simultânea.

(Fonte: Ecclesia)

segunda-feira, 26 de maio de 2008

Notas Finais - Carminhada - Braga - 24MAI'08

O Espírito Santo inunda o Carmo (Jovem) foi o lema que nos levou até Braga no sábado, dia 24 de Maio. Não éramos muitos pois cabíamos todos num autocarro de 55 lugares. Ainda assim foi bom. Melhor assim, se tivermos em linha de conta o que virá a ser o nosso dia.
A palavra forte ao longo do dia será «Inunda», logo depois de «Espírito Santo».
Quando às 10:00h a delegação de Viana do Castelo, a última, entrou na Igreja de Nossa Senhora do Carmo de Braga, já ali se encontravam todos os carminheiros. Logo depois iniciaram-se as operações comandadas pelo Tiago Gonçalves.

Havia gente nova, gente repetente e peregrifatis, quer dizer jovens que fizeram a Peregrinação a Pé a Fátima. Outros muitos não puderam vir, quase todos por boas razões; a maioria com imensa pena. Mas a vida não é só carminhar. O céu chovia, chovia que Deus a dava. Também por esta razão o verbo inundar será hoje o mais ouvido. A oração inicial foi decorrendo em paz e serenidade, e com o pensamento na chuva. Lemos o texto do Profeta Ezequiel que fala dos ossos ressequidos que se erguem e se põem a caminho pela força do Espírito de Deus. Logo depois o Superior da Comunidade, P. Agostinho Castro, em breves palavras, saudou-nos animando-nos a estar em paz na casa da Mãe, caminhar em paz e a regressar em paz. Recordou também que a «caminhada mais importante é ao centro do coração onde está a Verdade». Verdade que ele ainda não sabia que não caminharíamos como fora programado e como tanto era desejado.
A igreja estava escura. A Igreja do Carmo de Braga é escura e convidativa ao recolhimento. Mas aquele céu cor de chumbo e de chuva escurecia ainda mais a igreja. Não foi pois necessário sair fora de portas para perceber que não se poderia sair. Não carminharíamos como tanto gostamos!
Passámos por isso à execução do Plano B: caminhar dentro, com mais atenção ao interior. Caminhar dentro, mas sobretudo carminhar para dentro para «o centro do coração onde está a Verdade» (Palavras do P. Agostinho Castro). Assim, num primeiro momento dividimos o grupo em cinco pequenos cenáculos que foram convidados a ouvir o testemunho dos peregrifatis e a rezar uma de duas orações: ou a que pede os sete dons do Espírito Santo ou a que pede os Seus doze frutos. (Todos escolheram a que pedia os sete dons. Coincidência? Inteligência? Inspiração?) E a manhã ia ficar por aqui quando, empurrados mais pelo desejo de carminhar que pela eleição da escolha mais prudente, nos fizemos ao caminho. O Tiago Gonçalves, alto, voz forte e encorpada, declarou: «Vós sois testemunhas do Espírito Santo, carminhai em paz!»
E saímos do templo. À frente ia o cajado que ninguém «está autorizado a ultrapassar» e uma pequena candeia acesa, que nos recorda que temos a Luz por guia. Caminhamos descontraidamente durante 45 minutos, da Igreja do Carmo à Capela de Nossa Senhora de Guadalupe, por um caminho mais longo que o normal, que nos fez passar pelo centro da cidade. Chegamos. Que linda é a Capela de Guadalupe! A receber-nos estava o Dr. Ricardo Carvalho, membro da Irmandade de Guadalupe, que nos sintonizou com a história e as vicissitudes do templo e nos despertou para a singular beleza daquela capela tão pequena, tão acolhedora, tão sóbria e por tudo isso (e muito mais) tão bela!
Ali rezamos como manda o preceito e escutamos a voz do Papa, como também mandava o protocolo das carminhadas deste ano pastoral. Foi bonito estar em sintonia com aquela pequena comunidade que ali se reúne para celebrar a fé, e sobretudo com a agilidade daquelas gentes que converteram aquele celeiro bastardo em Casa do Pão. Digo bastardo, porque a primeira função daquele edifício foi a de lugar sagrado (capela), depois foi mal convertida em celeiro e agora novamente em capela, ou seja em Casa de Pão bom, a Eucaristia.

Já não foi fácil sair dali. Primeiro, porque a capela é bela. Depois, porque – e via-se dali! – a chuva que caía sobre o Mosteiro de Tibães em breve cairia sobre Guadalupe. Mas ainda assim fomos para a estrada. Não descêramos ainda à Rua de S. Margarida e já chovia. Acoitamo-nos por baixo do Diário do Minho, mas as ânsias eram tantas que, ala!, vamos carminhar! E fomos. Mas ainda não tínhamos passado o Paço Episcopal e a chuva mais que redrobara. E não havia ali lugar para nos recolhermos! Iam abertos uns poucos guarda-chuvas que alguns, mais prudentes como as virgens do Evangelho, haviam trazido, mas eram insuficientes. Havia muitos em falta, para que bem se completasse naquela hora a parábola evangélica sobre a imprevidência. Quando nos abrigámos numa bela arcada duma grande livraria ninguém estava grandemente molhado, não tinha sucedido nenhuma azar excepcional. Estávamos, por assim dizer, ligeiramente respingados. Mas também era certo que ao benzer a chama que nos acompanhava, o Frei João rezara:

«Que a bênção da chuva fecunde a terra
e caia gentil sobre as nossas cabeças refrescando as nossas almas
com a doçura de pequenas flores recentemente floridas.»

Tudo estava certo, tudo estava no seu lugar. Até a chuva que nos refrescara os corpos e nos recordava que o Espírito Santo desce sobre nós até à alma para a renovar e revivificar!
Por fim a chuva deu-nos algumas tréguas. Estávamos a meio caminho do nosso destino final, a Mata do Convento franciscano de Montariol. Porém, decidimos regressar a casa. Era uma hora da tarde e ninguém protestou. As sandes e os sumos esperavam por nós. (Gostei sobretudo que ninguém tivesse protestado, sinal que o espírito de aventura era suportado pelas asas da compreensão!)
Durante o almoço que comemos diante do olhar da Senhora do Carmo o tempo não melhorou o suficiente para decidirmos andar o caminho em falta. Mas deu para tomar café. No fim da pausa do café e porque já não dava para andar para trás, caminhamos em frente. Decidíramos rezar o Terço em tons juvenis e vestido de roupas carmelitanas. Assim, na porta de entrada da igreja rezámos o primeiro mistério e recordámos o nosso baptismo; à volta do altar rezámos o segundo e fizemos memória da Eucaristia que nos alimenta e fortalece; junto do túmulo de Frei João d’Ascensão Neiva rezámos o terceiro e recordámos que há santos no meio de nós, que caminharam no passado ao nosso encontro para nos trazer a Igreja e o amor a Nossa Senhora; no jardim conventual rezámos o quarto e recordámos a beleza do Carmelo povoado de tantas, tão belas e variadas flores; na capela do antigo Seminário rezámos o último e recordámos aquela casa vazia e outros muitos Seminários vazios e a fome imensa de sacerdotes e de Eucaristia!
A tarde pusera-se boa. Quente até. Mas já decaía, não dava para muito mais.
Depois de breve intervalo recolhemo-nos de novo. Era preciso continuar essa carminhada interior que o Senhor nos proporcionara com solicitude. E lá fomos.
Fizeram-se os últimos preparativos para celebrar a Eucaristia. Era a do Oitavo Domingo Comum e ainda faltava a maior inundação. Uma inundação de fé, de festa, de amor, de serenidade, de fogo e de luz. De alegria, de paz, oração e de Espírito Santo. Foi serena a Eucaristia, serena apesar de demorada. Demorada, mas sem que ninguém reclamasse, sem que ninguém se cansasse. Celebrada demoradamente para que Jesus falasse calmamente a cada um e cada um caladamente a Jesus.
Antes da Eucaristia a máquina fotográfica oficial emperrou, destemperou-se, retorceu-se, transtrocou as funções, sei lá. (Coisas da inundação, concerteza!) E o maquinista, decepcionado e desesperado, nada pôde fazer. Em suma, foi impossível tirar fotografias. O que até é bom e simbólico, pois há coisas que as palavras não alcançam dizer e é melhor que nada digam, mas que calem no fundo da alma, que se amainem nesse mais profundo centro onde só entra o Amado e a amada. E se as palavras ficam mudas e incapazes também não é bom que as fotos falem o que só poderiam falar enviezado e desfocadamente.
Não há, portanto, fotos da Eucaristia. Nem fotos nem palavras. Ou se há são muito poucas. Ficou, porém, célebre, uma em que o sr. José recebeu do carminheiro mais jovem, o Romão, uma faixa do Movimento. Estão a apertar as mãos sob o olhar atento do Frei João. Essa é a melhor síntese da carminhada, da inundação, daquela Eucaristia, daquela família. Foi bonito.
Depois, debaixo duma enorme bola de fogo que se acendeu ali, pedimos ainda ao Espírito Santo que inundasse as nossas realidades, as nossas pessoas, famílias, amigos, grupos, Igreja, comunidades, doentes, sacerdotes, escolas, ruas, recreios, casas, bibliotecas, trabalhos.
Por fim, recebemos a bênção, uma bênção de luz e de fogo em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo. E estava tudo terminado. Estava tudo terminado, não. Falta aqui dizer que na carminhada de Alhadas e Maiorca, no dia 16 de Fevereiro passado, nos animáramos a saudar o Santo Padre enviando-lhe uma carta. A carta já foi postada por isso não falaremos aqui dela. Basta percorrer o Blog. Pois sucedeu que obtivemos resposta e foi agora a altura de dar conhecimento dela. Lemos a carta na Eucaristia e saudamo-la com uma grande salva de palmas, como se o Papa ali estivera em pessoa. A carta será postada a seu tempo, dando tempo apenas para saborear a que em tão boa hora lhe escrevemos.
Tudo estava consumado. Urgia partir dali para Alhadas, Aveiro, Caíde, Viana e os bairros em volta do Carmo. Urgia partir, mas como sempre o mais difícil são as despedidas. E como falhava o desembaraço veio a chuva e meteu tudo dentro dos (auto)carros.
Também me fiz à estrada. Lentamente. Chovia tão forte, tão fortemente que nada se via. O regresso foi lento. Ao que soube depois choveram nas estradas que foram para o Sul, nas que foram para o Norte, para Este e Oeste. Choveu fora e dentro de nós. Houve inundação. Alguém garantiu que sentiu um tsunami. Não serei eu a desmentir.
Houve concerteza Carmo Jovem em comunhão com Deus Espírito Santo.
Estão terminados dois anos de carminhadas. Oito ao todo. Há quem garanta que valeu a pena porque nada falhou. Por mim, garanto simplesmente, que caminhamos na presença de Deus e que Deus caminhou connosco. Eu senti-O. Mas é impossível que neste deserto que já leva dois anos não tenham surgido falhas. Ausências. Inquietudes. Percalços. Talvez a Luz brilhe de tal forma que as não deixe ver.
Foi bom e continua a ser bom carminhar.
P’rá frente é caminho. Ele vai à frente.
«Sois testemunhas do Espírito Santo, carminhai em paz!», gritou-nos novamente o Tiago no fim da Eucaristia. Pois somos. Carminhemos! Em Alhadas e Maiorca os campos de arroz estão verdes, tão verdes que não deveríamos deixar de carminhar.

sábado, 24 de maio de 2008

Fotos - Carminhada - 24MAI'2008 - Braga









Carta ao Papa

«O Espírito Santo inunda o Carmo (Jovem)» Foi o lema que nos lançou a carminharmos em Braga, hoje, dia 24 de Maio. Nesta Carminhada foram lidas e saudadas com palmas as palavras de alento, e entusiasmo do Santo Padre para o Movimento Carmo Jovem.
Na Carminhada de Alhadas e Maiorca em Fevereiro tínhamos prometido saudar o Santo Padre, e assim fizemos. E Ele, gentil, respondeu-nos. Agora publicamos a nossa carta. Depois a resposta. Queremos que todos os jovens Carmelitas sintam próximo de si a pessoa e a voz do Papa.

JM † JT

Viana do Castelo, 16 de Fevereiro de 2008

Santo Padre,
pedimos-lhe a vossa bênção e confiamos-lhe a nossa oração na força do Espírito Santo!

Hoje, dia 16 de Fevereiro de 2008, fomos 150 Jovens Carmelitas caminhando convosco por terras da Figueira da Foz, Portugal. Animados pelo Espírito Santo subimos ao Monte Tabor e também nós, no fim, ousámos dizer as palavras do Apóstolo Pedro: «Senhor, como é bom estarmos aqui»!
Os jovens do Movimento do Carmo Jovem continuam a ouvir as vossas palavras, a trazer consigo o vosso convite para nos pormos a caminho como testemunhas de Jesus com a audácia a que o Espírito nos convida. No nosso caminhar de fé queremos ser Igreja com a Igreja, fermento que fermenta, pés que andam e corações que amam. É assim que queremos seguir Jesus.
Neste nosso Encontro que realizamos na sequência de outros, o Santo Padre esteve especialmente presente nas nossas orações, pois vos amamos como a B. Jacinta, pastorinha de Fátima.
Queremos agradecer-vos as palavras que nos dirigistes na Mensagem para a XXIII JMJ. O convite que fazeis aos jovens de todo o mundo cala em nós, e com o ânimo do Espírito Santo, fonte de vida, sentimo-nos impulsionados a renovar a nossa esperança. Aceitamos o convite, e fazemo-nos ao caminho, fazendo dele uma escola de oração segundo os nossos pais S. João da Cruz e S. Teresa de Jesus.
Aceite e guarde esta pequena gota que somos. O nosso Movimento é uma pequenina gota no imenso oceano da Igreja a quem amamos e por quem rezamos. Nós, Jovens Carmelitas portugueses, aceitamos continuar a ser desafiados a caminhar com Jesus, a manifestar apreço pela sua palavra que nos convoca para a ternura de Deus e o serviço dos irmãos.
Queremos continuar a crescer na intimidade com Deus, a beber da «Fonte que mana e corre», a olhar para a Espiritualidade e a História da Ordem do Carmo com amor e vontade de a imitar!
Porque o Espírito Santo nos anima não podemos ficar parados, seremos testemunhas da «Chama de amor viva» que arde dentro do coração de cada um de nós e dos nossos grupos.
Santo Padre, nós, jovens do Carmo Jovem, agradecemos com carinho a maneira como abraça e acolhe o mundo. Não nos é indiferente a vossa acção missionária. Por isso seguiremos rezando pelo vosso serviço à Igreja. E procuraremos imitar-vos e seguir-vos. Rezamos ao Espírito de Jesus para que anime o nosso Pastor, o abençoe e santifique. Que a Virgem Mãe, Rainha e formosura do Carmelo, caminhe sempre convosco.
Todos os jovens carmelitas vos saúdam com afecto e alegria.


VERÓNICA RAQUEL GUIMARÃES PARENTE
(Coordenadora Nacional do Movimento do Carmo Jovem)


-------------------------------------------------------------------------------------
No Carmo Jovem somos rapazes e raparigas que desejamos viver o nosso compromisso de baptizados, construindo a fraternidade proposta por Jesus Cristo, em continua presença de Deus, como a Virgem Maria; ao serviço da Igreja e segundo o projecto de vida proposto por João da Cruz e Teresa de Jesus.

quinta-feira, 22 de maio de 2008

[Que bem sei eu a fonte]


SOLENIDADE SANTÍSSIMO CORPO E SANGUE DE CRISTO


«Que bem sei eu a fonte que mana e corre
mesmo de noite.

Aquela eterna fonte está escondida,
mas eu bem sei onde tem sua guarida,
mesmo de noite.

Sua origem não a sei, pois não a tem,
mas sei que toda a origem dela vem,
mesmo de noite.

Sei que não pode haver coisa tão bela,
e que os céus e a terra bebem dela,
mesmo de noite

Eu sei que nela o fundo não se pode achar,
e que ninguém pode nela a vau passar,
mesmo de noite.

Sua claridade nunca é obscurecida,
e sei que toda a luz dela é nascida,
mesmo de noite

Sei que tão caudalosas são suas correntes,
que céus e infernos regam, e as gentes,
mesmo de noite.

A corrente que desta fonte vem
é forte e poderosa, eu sei-o bem,
mesmo de noite.

A corrente que destas duas procede,
sei que nenhuma delas a precede,
mesmo de noite.

Aquela eterna fonte está escondida
neste pão vivo para dar-nos vida
mesmo de noite.

De lá está chamando as criaturas,
que nela se saciam às escuras,
porque é de noite.

Aquela viva fonte que desejo,
neste pão de vida já a vejo,
mesmo de noite»
[S. João da Cruz]

«O cálice de bênção, que abençoamos, não é comunhão com o sangue de Cristo? O pão que partimos não é comunhão com o corpo de Cristo? Uma vez que há um único pão, nós, embora muitos, SOMOS UM só corpo, porque todos participamos desse único pão». [1ª Carta aos Coríntios 10,16-17]

Eucaristia é um mistério de infinito Amor para o Mundo, só poderá ser aceite pela fé e onde a razão do Homem continuará a fazer a experiência das suas limitações. Que a experiência deste Deus Amor se cale em nossos corações!...

terça-feira, 20 de maio de 2008

OBRIGADO será a palavra que encerra tudo!

Olá! Conhecemo-nos em Caíde de Rei. Na altura, pensei que seria mais um passeio, mais uma "excursão" em que alguém teria de tomar conta dos mais novos (e eu que já sou quase "cota" nestas coisas), aceitei esse papel! Mal sabia eu que eram os mais novos que me guiavam e me ensinavam o caminho! Obrigado para eles também, principalmente para a Filipa! Obrigado a vocês, Carmo Jovem! OBRIGADO será a palavra que encerra tudo quanto poderia dizer-vos!Obrigado por existirem, por me incomodarem, por me fazerem sentir de novo tão pequenina!! Diante de Deus e de todos os homens! Há uns tempos a esta parte sigo o Caminho doutra maneira. É um respirar, e ver o filme do lado de fora! É bom ser espectador! Mas os jovens da minha terra pediram-me que os acompanhasse até vós e claro que não consegui recusar! E ainda bem! O vosso espírito mexeu comigo ou o Espírito Santo, não sei! Deus quis balançar-me outra vez e foi bom!
Reencontrei-vos nas Alhadas, na vossa passagem a caminho de Fátima (para o ano quero ir convosco) e foi bom novamente!! Sinto que Deus está sempre a chamar-me, não sei ainda muito bem para quê, mas se for para ir convosco, gosto da ideia!! Não sei se terei coragem de recomeçar as catequeses, sei que quero e preciso de me Dar mais, estou muito pobre desde há uns tempos! Talvez com a vossa ajuda e a de Nosso Senhor eu me descubra outra vez! Obrigado por me contagiarem com o vosso vírus! CÉLIA OLIVEIRA, Moinhos da Gândara (Figueira da Foz)

segunda-feira, 19 de maio de 2008

Testemunho VI - II Peregrinação a Pé a Fátima

Alguém disse um dia,
“I have a dream!”

Pois, bem, eu tinha um desejo já há muitos anos:
Ir a Fátima a pé.

Este desejo nunca teve data ou hora marcada. Mas, quisera Deus e a Nossa Senhora do Carmo que fosse este ano e com um grupo de Jovens Carmelitas, o Grupo JOVENS LEIGOS EM MOVIMENTO.

Mas o que procurei nesta peregrinação?
Agradecer a Deus tudo quanto me dá.
À partida, pensar em caminhar durante 4 longos dias, ou mais exactamente 140 Km (desde o Carmo de Aveiro até o Santuário de Fátima) parece um desafio impossível. Não pensei nunca na dificuldade, ou na totalidade do percurso. Mas, optei por me sentir feliz por cada passo que dava e por cada etapa superada.

Podem não acreditar. Mas, agora que já passou, a sensação é que tudo foi estupidamente fácil. Ainda não descobri porquê. Mas, houve muita coisa a ajudar. Em primeiro lugar a organização. Toda a peregrinação foi racional e meticulosamente pensada para que cada elemento do Grupo atingisse o seu objectivo, chegar a Fátima a pé. Como nos foi dito no dia de acolhimento, “Haverá um (mais precisamente três) carro-vassoura para transporte de mochilas e dos mais cansados, mas a maior honra dos condutores é chegar sem passageiros”.
Em segundo lugar a reflexão espiritual que nos era proposta em cada dia e que dava sentido a cada dia e em terceiro lugar, mas tão importante como o primeiro, o carinho e o apoio do grupo, especialmente dos mais novos, que estão habituados a fazer carminhadas e para quem o percurso não demonstrou qualquer dificuldade.

O que me impressionou?
Um grupo de JOVENS com valores e que sentem o apelo de Deus, que se sacrificam por um objectivo.

Mais uma vez tenho que agradecer, pela fé que demonstram. Se não fossem eles, não teria desfrutado deste desafio que deixou marcas. Em termo físicos foi poupada. Pois não tive uma única bolha nos pés e as pernas também se portaram bem. Mas em termos psicológicos, irão ser sempre recordados com muito carinho. Passei a tratá-los por “Meu coração” que é a forma carinhosa com que trato os meus amigos do peito.

Se me permitem o atrevimento,
Saudações carmelitas,
Um beijinho muito grande de OBRIGADA,
E até,
Talvez, para o ano,

CARMEN MARQUES (CAMI), 42 anos, Aveiro

domingo, 18 de maio de 2008

Festejamos a Santíssima Trindade.

«A graça do senhor Jesus Cristo, o amor de Deus e a comunhão do Espírito Santo estejam com todos vós» [2 Cor 13,13] Não podemos calar experiências que são como vírus: quanto mais estamos inseridos mais queremos repetir e permanecer. Foi o que aconteceu no Sábado dia 17 de Maio, no Convento do Carmo em Viana do Castelo, os peregrinos da II Peregrinação a Pé a Fátima do Carmo Jovem, reuniram-se para celebrar um dos mais importantes dias do ano litúrgico, comemorar a Santíssima Trindade. Juntos em família e comunidade celebramos o dogma da fé e do Amor num único Deus, em três pessoas distintas: Pai, Filho e Espírito Santo! Nestas vivências de amor entramos um pouco mais na intimidade com Deus e com os irmãos, dilatámo-nos no conhecimento deste Deus e no grande mistério que nos tem para ofertar. A eucaristia foi e será um manancial de acção de graças pelos dons com que Deus Pai, Filho e Espírito Santo dotou cada um. Não podemos viver sem ela. Benevolência filial dimanada nos nossos corações nos quais jorra a alegria pela compreensão de sermos Filhos de Deus, herdeiros da glória. A presença do grupo peregrino por terras do minho, continuou após a eucaristia em convívio amigo e familiar. Foram revistos momentos da II Peregrinação onde cantamos, rezamos, ouvimos, choramos e rimos... Recordando, eternamente viveremos! Recordaremos muitas vezes o que vimos e ouvimos. Em cada foto vista, um momento da nossa história pessoal se encontra. Encontramos e encontraremos tesouros num caminho sempre diferente, sempre novo. Caminho que nos centra a viver de uma forma digna a nossa fé. Somos Peregrinos!
Como peregrinos que somos soubemos esperar pelas 24h para juntos, terminarmos o dia cantando os parabéns, felicitando a Delfina no dia do seu aniversário. Que ela continue a fazer da sua vida um eterno Dom de Deus. Como Jovens Leigos Carmelitas, em cada nó de união, confraternização e entrega, vamos desenterrando tudo aquilo que Deus precisa que cresçamos, sentimos cada vez mais uma ânsia de maior apostolado e de sermos continuamente Jovens Carmelitas em Movimento, de caminharmos em serviço, onde quer que estejamos e para onde quer que os desígnios deste Deus Amor nos leve... Neste Mês de Maio, peçamos a Maria nossa Mãe e Mãe da Humanidade, que nos ajude a caminhar com alegria e cheios de Esperança. Que a Rainha e Formosura do Carmelo nos oriente na descoberta do que Deus quer que sejamos capazes de fazer e o que devemos fazer. Que nos continuemos a comprometer.
Glorifiquemos a Santíssima Trindade, como manifestação da celebração e de vida. Que não percamos a melhor forma de o fazer. Continuemos a viver a unidade do Filho na máxima: «Que todos Sejam um» [Jo 17,21] «Somos um. Somos um… eu e Tu somos um»…

Elevação à Santíssima Trindade


«Ó meu Deus, Trindade que eu adoro, ajudai-me a esquecer-me inteiramente, para me fixar em Vós, imóvel e pacífica como se a minha alma estivesse já na eternidade. Que nada possa perturbar a minha paz, nem fazer-me sair de Vós, ó meu Imutável, mas que cada minuto me faça penetrar mais na profundidade do vosso Mistério. Pacificai a minha alma, fazei nela o vosso céu, a vossa morada querida e o lugar do vosso repouso. Que eu nunca Vos deixe só, mas que aí permaneça com todo o meu ser, bem desperta na minha fé, toda em adoração, toda entregue à Vossa Acção criadora.

Ó meu Cristo amado, crucificado por amor, quereria ser uma esposa para o vosso Coração, quereria cobrir-Vos de glória, quereria amar-Vos… até morrer de amor! Mas sinto a minha impotência e peço-Vos para me “revestir de Vós mesmo”, para identificar a minha alma com todos os movimentos da Vossa alma, para me submergir, invadindo-me, e substituindo-Vos a mim, para que a minha vida não seja senão uma irradiação da Vossa Vida. Vinde a mim como Adorador, como Reparador, e como Salvador.


Ó Verbo Eterno, Palavra do meu Deus, quero passar a minha vida a escutar-Vos, quero tornar-me inteiramente dócil, para tudo aprender de Vós. Depois, através de todas as noites, de todos os vazios, de todas as impotências, quero fixar-Vos sempre e permanecer sob a vossa grande luz; ó meu Astro amado, fascinai-me para que eu não possa jamais sair da vossa irradiação.

Ó Fogo consumador, Espírito de amor, “descei sobre mim”, para que na minha alma se faça como que uma encarnação do Verbo: que eu seja para Ele uma humanidade de acréscimo na qual Ele renove todo o seu Mistério. E Vós, ó Pai, debruçai-vos sobre a vossa pequena criatura, “cobri-a com a vossa sombra”, não vendo nela senão o “Bem-Amado” no qual pusestes todas as vossas complacências.

Ó meus Três, meu Tudo, minha Beatitude, Solidão infinita, Imensidade onde me perco, entrego-me a Vós como uma presa. Sepultai-Vos em mim para que eu me sepulte em Vós, enquanto espero ir contemplar na vossa luz o abismo das vossas grandezas».

[Meditação da Elevação à Santíssima Trindade - Isabel da Trindade, NI 15]

quinta-feira, 15 de maio de 2008

Testemunho V - II Peregrinação a Pé a Fátima

Percorrer os caminhos até Fátima para mim não era novidade pois anteriormente já tinha percorrido o mesmo caminho ao encontro de Maria.
Nestes últimos dois anos em que o Movimento Carmo jovem organizou a Peregrinação a Fátima ofereci-me sempre como voluntária para a equipa de apoio. Eu já conhecia as dificuldades que se sentem ao percorrer tantos quilómetros a pé e quis dar todo o meu apoio a todos os peregrinos.
Este ano fi-lo “In Obsequio Iesu Christi” … fi-lo para acompanhar o meu marido que fez todo o caminho a pé … fi-lo para dar forças aos elementos que percorreram o caminho a pé não desanimassem e que o caminho torna-se mais agradável … fi-lo para também dar apoio à Verónica e ao meu Pai, António Branco, que conduziam as outras duas viaturas de apoio.
Percorrer o caminho numa viatura, sozinhos agarrados ao volante também não é fácil, pois não sofremos das dores mas, por vezes, o desânimo também nos toca. Mas dada à experiência tida anteriormente pensei que o meu maior contributo nesta Peregrinação seria dar apoio a quem caminha, sabendo que entretanto também ia peregrinando a par com eles.
E assim se fez a Sua Vontade.
Naturalmente, o caminho foi longo e doloroso, principalmente para quem não está habituado a percorrer tantos quilómetros a pé e não tem noção das distâncias, nem das dificuldades que se encontram, mas também o é para quem já conhecia o caminho e o repetia, sendo também para quem tem de levar uma viatura … No entanto lá ia dando ânimo a quem percorria os caminhos “In Obsequio Iesu Christi”.
E a cada quilómetro percorrido, quer a pé quer de carro, as dificuldades eram vencidas e Jesus Cristo estava mais próximo de nós! E há medida que todos iam atingindo a “meta” diária ficava contente por ter ajudado o meu amigo a ultrapassar uma dificuldade e esse amigo ter-me também ajudado…
A vida é também feita de dificuldades. Ninguém nos disse que o caminho é leve. A cada novo dia as forças redobravam. Estávamos em família, e com Jesus ao nosso lado percorríamos os largos quilómetros de cânticos e de palavras…

SUSANA BRANCO, 32 anos, Gafanha da Nazaré

Testemunho IV - II Peregrinação a Pé a Fátima

Olá, jovens peregrinos.
Fiz a Peregrinação a Fátima como todos vós com muita alegria.
Agradeço a Maria, esta oportunidade de continuar a caminhar com Ela e por Ela até Jesus.
Foi muito bom, apesar das dores, do cansaço, é reconfortante chegar ao fim do dia todos juntos e felizes, porque conseguimos vencer mais uma etapa do nosso caminho.
Este foi particularmente muito especial, fazer a experiência dos discípulos de Emaús ficará para sempre gravada no meu coração e espero que no vosso também… tantas vezes ELE caminha a nosso lado e os nossos olhos e ouvidos continuam fechados (é tanto o ruído na nossa vida).
Precisamos Senhor, que a tua Palavra aqueça o nosso coração e ilumine a nossa inteligência, que o teu Pão alimente a nossa fome e nos dê forças para amar…
Quero pedir-te Senhor que caminhes sempre connosco, principalmente quando a tristeza e o desânimo entram no nosso caminhar. E que eu saiba reconhecer-Te sempre naqueles que caminham a meu lado e precisam da minha ajuda ao longo do caminho.
Tu sabes como sou «pequenina», mas aceita Senhor o pouco que sou, para que possa ser um bocadinho do Teu tudo para os meus irmãos…
A todos agradeço a alegria e a amizade com que vivemos mais esta caminhada.

Obrigado pelo vosso carinho e pelos vossos miminhos.

DELFINA RIBEIRO, 38 anos, Caíde de Rei

terça-feira, 13 de maio de 2008

Belíssima oportunidade para nos (re)encontrarmos

Uma belíssima oportunidade para nos (re)encontrarmos não só com Ele, mas com os outros.
No passado sábado, dia 10 de Maio a comunidade de padres e leigos do Carmo de Aveiro homenagearam o Frei João Costa pelos 2 triénios de serviço à comunidade. Um grupo significativo de peregrinos a pé a Fátima do Carmo Jovem, reuniu-se em Aveiro para juntos continuarmos a ser testemunhas do Amor de Deus.
Tornámo-nos mais irmãos e mais cristãos «In obsequio Iesu Christi» dando corpo à expressão que caracterizou os primeiros cristãos «Olhai como eles se amam».
Deste amor queremos continuar a falar, neste amor, construiremos pontes e cresceremos nos carminhos que o Mestre nos manda seguir.
Dos rios que correm para o mar, nos falou Frei João Costa na homilia desta tarde. Também nós jovens em Movimento queremos continuar a por os olhos n´Ele e em todos os que, com Ele, são capazes de navegar no mar encapelado da vida, segurando as redes com ardor, convictos que neste mar encontraremos a mão segura do Mestre.
Que Nossa Senhora do Carmo, Nossa Mãe e Senhora do Sim, o acolha sob o seu manto, o ilumine e o proteja para que continue a ser presença deste Deus que é Pai.
Em Viana do Castelo, na Igreja Nossa Senhora do Carmo, com Teresa de Jesus e S. João da Cruz permaneça testemunha do amor de Deus, anunciador da Boa nova e a viver «In obsequio Iesu Christi».
Conte connosco, continuaremos a contar consigo!

“Porque Te Amo, oh Maria”


«Oh! Quisera cantar, Maria, por que te amo
Porque é que o teu nome tão doce me faz vibrar o coração
E porque o pensamento da tua grandeza suprema
Não poderia inspirar à minha alma o sentimento do temor.
Se eu te contemplasse na tua sublime glória
E mais brilhante do que todos os bem-aventurados,
Não poderia acreditar que sou tua filha
Ó Maria, diante de ti, eu baixava os olhos!...

Já que o Rei dos Céus quis que a sua Mãe
Mergulhasse na noite, na angustia do coração,
Maria, é então um bem sofrer na terra?
Sim, sofrer amando, é a felicidade mais pura!...
Tudo o que Ele me deu Jesus pode tomá-lo
Diz-lhe que nunca se constranja comigo…
Ele pode esconder-se, eu consinto em esperá-l´O
Até ao dia sem acaso em que se extinguirá a minha fé…

Amas-nos, Maria, como Jesus nos ama
E consentes por nós em afastar-te d´Ele.
Amar é tudo dar e dar-se a si mesmo
Quisestes demonstrá-lo ficando connosco.
O Salvador conhecia a tua ternura imensa
Sabia os segredos do teu coração maternal
Refugio dos pecadores, é a ti que Ele nos deixa
Quando abandona a Cruz para nos esperar no Céu”.»
[Santa Teresa do Menino Jesus (Estrofes 1, 16, 22)]



Maria, hoje aproximamo-nos de Ti para que com o teu exemplo e com a Tua força possamos servir melhor a Deus com aquilo que somos e com o que temos. Em Ti veremos brilhar eternamente a maturidade humana e a elegância espiritual. Oh! Mãe admirável do silêncio, envolve-nos no Teu manto, fortalece-nos com a Tua fé e fecunda-nos com o Teu Amor. Dá-nos a Tua mão de Mãe para que acertemos sempre no carminho! Dá-nos a Tua bênção para que como Jovens Carmelitas no meio do mundo sejamos sinal da Tua Graça!

quinta-feira, 8 de maio de 2008

Carminhada - Braga - 24 de Maio

O ESPÍRITO SANTO INUNDA
O CARMO (JOVEM)!

Inunda o meu ser,
Inunda o meu ser.
Espírito, inunda o meu ser.
Em ondas de amor, ó vem sobre mim
Espirito, inunda o meu ser


Aspectos a ter em atenção:

- As Carminhadas são abertas a todos os jovens;
- Acolhimento às 9h00, na Igreja do Carmo (Braga);
- A Carminhada tem 11 km, e termina após a Eucaristia;
- Eucaristia às 17h00 no Seminário/Igreja do Carmo;
- O almoço será partilhado, devendo cada participante trazer de casa.
- Procura levar calçado confortável e já usado; roupa conveniente (um impermeável…);
- Haverá um carro-vassoura para transporte de mochilas e dos mais cansados, mas a maior honra dos condutores é chegar sem passageiros;
- Carminha ligeiro de equipagem: Nem tudo é necessário para carminhar!
- Quem já participou noutras Carminhadas tem a faixa “JOVENS LEIGOS CARMELITAS”. Devem levá-la.


CONFIRMAÇÃO
Agradecemos que envies a confirmação da tua participação na Carminhada deverá ser enviada até ao dia 17 de Maio para:
Grupo Apocalipse grupo_apocalipse@sapo.pt
Marta Pinto 917 010 781

CRÓNICA DUMA PEREGRINAÇÃO ANUNCIADA (V)

Dia 4 - 4 de Maio
Reconheceram-n’O ao partir do Pão!

Este ano ninguém me engana, pensei. E se bem pensei, melhor o fiz. Deitei o meu saco cama longe da sala dos motores, motorizadas e trotinetes dos meus companheiros. Fui dormir para um recanto do corredor. O que eu não contava era com a Ronca da Barra. Como se sabe a Ronca da Barra está lá para avisar os navios que devem fugir dos baixios e dos escolhos da beira-mar. Eu devia saber, mas tirei a prova bem tirada quando mesmo longe eu continuava sem querer navegar, mas a ter de aturar a Ronca que roncou para a esquerda quando virada para a esquerda e roncou para a direita quando virada para a direita. Ó que noite feliz teve a Ronca da Barra!
Também isto é peregrinação.
Por fim o dia raiou. (Ou quase raiou, porque nos voltaram a acordar às 05h00!) A maioria dormiu bem, porque Deus tinha-nos dado um chão tão fofo (ou um sono assaz pesado) para descansarmos, que todos nos levantamos frescos como alfaces.
O programa mandava celebrar Missa às 05h30. E só isso me levantou, que de contrário não me levantaria nem que me chamassem doze vezes (Andaria ainda por ali a Ronca?) Tinham-nos dito que a Missa seria de peregrino e não de beduíno. Ninguém descortinou o que isso fosse ou quisesse dizer, mas também o certo é que aquelas não são horas para muito pensar, mas para muito amar. Por essa razão, estando ainda muitos corpos a reclamar pela cama já os pés caminhavam. Nada havia a fazer. Ou melhor haver havia, caminhar. E Ele vai connosco! Pronto a dar-se a conhecer.
Pela frente estão outras seis horas de caminho, outros 30 quilómetros a fazer. Ou talvez mais porque subir a encosta de Santa Catarina da Serra não é pêra doce, é pereira amarga.
Lá fomos ligeiros, serenos e audazes que é ao que aquele vale prévio imenso convida.
Vencida a serra chegamos a Fátima. Ninguém desistiu, porque quando falharam as forças não falhou o coração. Se não foi o próprio foi o dos companheiros: há sempre um coração grande para nos animar, rezar, acompanhar, empurrar, puxar, eu sei lá, há sempre um coração que nos leva a Fátima… A espera na Rotunda Norte foi assaz breve, pouco mais duma quinzena de minutos. Quase nada custou juntar os quase trinta peregrinos a pedantes. Dali para o Santuário foi um salto. Ali entramos de forma organizada que dava gosto ver. Depois cada um ficou sereno e calmo, sem pressas nem pressões, diante do olhar de Deus e junto do coração da Mãe. Chegada a hora deixámos a Nossa Senhora a pedra de cada um (aquilo foi é que foi um monte grande de pedras pequenas. Não dá para uma construção, mas dá para ajudar!) e, mais leves, cumprimos a última etapa: alcançámos a Domus Carmeli, jovial e garbosa, que nos acolheu de braços abertos. Cumprido o preceito de aconchegar o estômago, passamos ainda pela Capela. Ali, no chão, brilhavam as flores que as carmelitas do Carmelo de São José nos ofereceram para oferecermos às nossas mães. A oração ali rezada rezava a nossa acção de graças pela meta alcançada, e pelo caminho caminhado na presença santa e bondosa do Pai, do Filho e do Espírito Santo.
Presidiu amavelmente à oração o Padre Provincial, Frei Pedro Ferreira, que nos disse palavras boas e outras esperançadoras como estas: «Se ninguém mais vo-lo disser, digo-vo-lo eu: a vossa peregrinação, as vossas dores e os vossos sofrimentos foram aceites no Céu! Estai certos disso! Estai certos de que ninguém, nem vós!, podereis retirar de lá o que lá acabais de lançar!» Ou porque o tempo urgisse ou porque muito tivéssemos rezado, não custou nada entrar nos carros (coisa rara!). Talvez fosse por ser dia da mãe. Talvez fosse por ainda faltar uma larga jornada até ao colo materno. Talvez fosse, não sei. Sei que depois de entrar no carro adormeci. Tinham-me perguntado se estava feliz, mas adormeci. Julgo que não respondi. Pelo menos com a boca. Mas se um homem adormece como um menino, que outra resposta se pode esperar à pergunta se está feliz?
Quando despertei estava em Aveiro. Parámos diante do olhar de São João da Cruz. Ali ficámos uns, e outros seguiram. Não houve choros nem lágrimas. Algumas saudades, apenas. Dia 24 já nos veremos novamente. Como se tivéssemos andado a roubar, rapidamente nos separámos e cada um foi à sua vida. Eu sei que não foi assim, mas diz-se assim para dizer todo o cofre cheio de desejos de chegar ainda hoje a casa com tempo e com luz para receber beijos, muitos beijos das mães e dar-lhes os beijos que elas merecem e que a Mãe do Céu mandou dar-lhe.
(E como são diferentes os beijos depois duma peregrinação!)
E acaba aqui a crónica. Mas não acaba aqui a peregrinação, porque como dizia o último SMS «O regresso a casa é a etapa mais difícil da Peregrinação». Se é, seja. O ano que vem o dirá. Que até lá Deus nos abençoe.
Que até lá, sobre todos os jovens carmelitas, que em peregrinação a pé a Fátima celebraram os 800 anos da Regra do Carmo:
Se abra a estrada à sua frente.Sopre levemente o vento nas suas costas.Brilhe cálido e suave o sol sobre a sua cara.Caia de mansinho a chuva nos seus campos. E até que de novo nos encontremos, Deus os guarde na palma de suas mãos...

CRÓNICA DUMA PEREGRINAÇÃO ANUNCIADA (IV)

Dia 3 - 3 de Maio
In obsequio Iesu Christi
O segundo dia de carminhada foi longo. O de hoje parece ser mais. O dia de hoje vai ser mais. Mais longo. Mais caminho. Mais quilómetros. Mais cânticos. Mais natureza. Mais sol. Mais peregrinos. Mais amizade. Mais searas. Mais passarinhos. Mais, simplesmente mais. Hoje é o dia mais.
O segundo dia foi longo. Tão longo que a sua longinquidade tornará curta a noite. Ao despertar não haverá tun-tuns, mas sininhos e música de anjos. No carmelo das maravilhas da Alice é assim! Sininhos, miminhos, música e demais (sim demais e demasiadas) carícias que fazem as delícias dos peregrinos e os deixam com ânsias de voltar ao lar. No Centro o despertar foi mais prosaico: a Verónica estava à porta para nos levar, e nós estávamos em Vale de Sacos de Cama. Mas rapidamente nos recompomos como se nada nos doesse, nem o caminho por andar nem o caminho já andado. E num santiámen já nos vemos estrada acima, estrada abaixo. À procura da outra parte dos peregrinos. Passámos pelo Carmelo onde tudo está pronto, formámos a caravana e eis-nos, enquanto tudo dorme, a caminho da Gala. Paramos na Gala para rezar e iniciar a nossa jornada In Obsequio Iesu Christi. E aquilo é que foi rezar! Escolhemos o mesmo local do ano passado. E passou-se um caso: passou-se que ou já não nos lembrávamos ou se deu um agravamento das condições. À medida que íamos rezando um enxame de melgas pairou sobre nós e foi mordiscando caras e braços, pés e pernas fazendo um inferno tal que só no Inferno pode haver. Nós aguentamos firmes, não sem distribuir alguns estalos caridosos nos companheiros e companheiras procurando eliminar as terríveis feras. Mas sem sucesso. Foram mais os estalos em vão (Perdoai-nos, Senhor! Misericórdia, Senhor! Miserere nobis, Domine! Kyrie eleison!) que bestas abatidas. Mas aguentámos firmes e rezámos. Quando foi possível fugimos, antes que fôssemos sugados para o ventre de tão mesquinhos bichos!
Fomos tomar um café para espairecer do terrível ataque e despertar os neurónios. E já os mais lentos tinham avançado alguns passos quando, à vista das feras, nos reunimos de novo para as Pistas, que, hoje, são muito simples: seguindo uma tradição antiga e popular, hoje, dia 3 de Maio, antigo dia da Santa Cruz, diremos mil vezes o nome de Jesus! E lá partimos em silêncio, de terço na mão e o Santo Nome de Jesus nos lábios.
1,2,3,4,5,6…
A manhã ainda é bebé quando nos afoitamos ao caminho suave. É sábado e todo o mundo dorme, estradas e caminhos inclusive. O caminho é manso e suave, os carros e os camiões dão-nos tréguas. O sol vai despontando timidamente. O perfume dos pinheiros invade os pulmões e refrescam-nos. A natureza canta e grita de alegria à nossa passagem. Há pinheiros e campos, roseirais e casas semi-adormecidas, cebolais e trigais que nos saúdam e animam. Damos um passo e mais um passo, e lá vamos dizendo, Jesus, Jesus, Jesus, Jesus.
222,223,224,225,226,227…. O caminho começa a subir e os bofes a sair. Alguém que se cruza comigo dá-me os bons dias e em troca escuta: - Jesus, Jesus! Foi sem querer, mas foi a resposta mais bonita que se poderia dar. É que dizer Jesus é dizer Salvador, salvação, alegria, fé e festa! A senhora há-de ter compreendido certamente! E talvez até agradecido.
500,501,502,503,504,505,506,507,508…
O caminho está este ano mais complicado. Ao lado da EN 109 nasceu a A17. Sempre que a A17 desagua na EN109 nasceram rotundas imensas.
667,668,669…
E o aparecimento de rotundas significa o aumento de complicações para quem caminha a pé. Porém, apesar de mais este contratempo lá avançamos generosos e com ânsias de que a coisa termine. Não é que seja coisa ruim ou má, mas antes o desejo de alcançar o proposto, vencer os obstáculos, encurtar as distâncias, saciarmo-nos da paz do Santuário, subir para Deus, entrar para o seu coração, adormecer no seu peito, confidenciar-lhe o que não pode ser dito no recôndito dos quartos nem nas veredas dos caminhos.
888,889,890,891,892,893,894…
E lá continuámos. Uns ligeiros, os veteranos. Outros mais cansados, os principiantes. Mas em todos há vontade e garra de avançar. E vamos avançando durante grande parte da manhã em silêncio.
921,922,923,924,925…
Avançamos, avançamos, avançamos sem medo. Sem medo avançamos, porque Jesus vai connosco.
999,1000. Mil vezes! Mil vezes! Mil vezes Jesus!

Mil vezes, Jesus!
Sempre Jesus!
Mil vezes mil, Jesus!
Sempre Jesus!
Sempre Jesus nos lábios!
Sempre Jesus no coração!
Sempre Jesus nas lágrimas!
Sempre Jesus nas preces!
Sempre Jesus nas saudades!
Sempre Jesus nas palavras!
Sempre Jesus nos pensamentos!
Sempre, Jesus sempre!
Sempre Jesus nos sentimentos!
Sempre Jesus nos passos!
Sempre, sempre Jesus!
Sempre, sempre o seu Santo Nome!
Sempre connosco!
Sempre em toda a parte!
Sempre por dentro como um afago!
Sempre por fora como um agasalho!
Sempre Jesus como uma armadura!
Sempre Jesus! Mil vezes Jesus!
Mil vezes sempre mil vezes vezes mil, Jesus sempre!

Quando chega a hora do reforço esticámo-nos no chão. Esticámo-nos, não! Há quem prefira continuar e evitar a tortura do levantar e do pôr em andamento a carcaça, essa velha máquina a vapor tão lenta, mas tão fiel e sólida. A carcaça, a máquina a vapor, o corpo ou o irmão burro (como lhe chamava S. Francisco) é tudo o mesmo!
Durante a manhã caminhamos seis horas. Há quem diga que a média são 5 quilómetros por hora. Mas talvez seja mais. Hoje é o dia mais. O céu pejado de nuvens ameaça chuva. Chegamos por fim à Ilha e a um cafezito simpático que no ano passado nos livrara do frio. Abancámos aí. O café está mais acolhedor, mercê dum corta-vento cuja ausência no ano passado tanto lamentámos. Comemos os pães que a prioresa do carmelo de Alhadas nos deu. E comemos também uns frangos de churrasco. E até comíamos mais. Mas nem as sandes eram mais, nem a inexperiência nos fez comprar mais churrasco. Mas ficámos bem, graças a Deus.
Depois da refeição esticámos as pernas e demais ossos do esqueleto. Há quem durma a sesta e quem alongue as pernas pelas paredes acima. Cada um arranja a estratégia que lhe traga mais conforto.
Custou deveras voltar ao caminho. Mas uma vez ali nada nos deteve. Nem as flores nem as feras.
O percurso da tarde é tão belo quanto o da manhã, mas com mais peregrinos. Vão muitos peregrinos connosco. Uns rezam, outros cantam, outros riem. E todos sofremos. Alguns, que ultrapassámos, já os conhecemos de jornadas anteriores. São breves reencontros, porque logo os passamos e seguimos em frente. Depois do terço vêm os cânticos e depois dos cânticos as histórias e depois destas as confidências. E no fim de tudo o amor. E sempre o amor. Ámen, Jesus. Que aquilo que aqui fazemos não é mais que obsequio Iesu Christi, serviço e seguimento do Mestre.
Foi talvez a jornada em que durante mais tempo caminhámos em grupo. Os pés já não temem a estrada nem o corpo as dores. Por isso vamos. Há concerteza gente em dificuldades, mas como estamos cada vez mais perto ninguém desanima ou se poupa.
Há quem caminhe só, em silêncio, buscando, ao que dizem, respostas a perguntas que só o tempo e a solidão trazem à alma. Há quem caminhe lado a lado, como os de Emaús, mas sempre mantendo o preceito de ouvir o que Ele diz, e «dizer o que Ele diz, mas só o que Ele diz que é para dizer».
Chegamos por fim ao Barracão, fim da nossa terceira jornada. O Barracão foi mais uma vez para nós um zénit e um bom augúrio: quem chega ali chega ao fim.
Rapidamente as carrinhas nos devolvem à Ilha, ao Centro Social e Paroquial. Mais uma vez somos ali bem recebidos pelo pessoal da Casa que nos recebe em nome do Reverendo Pe Nogueira. Ali houve tempo para tudo, até para um dos nossos actores amadores vender sardinha numa canasta sem sardinha. O azar dele foi que o povo tem dinheiro e fome de sardinha, mas como ele não tinha sardinha teve de ter lata para sair airosamente da situação.
Depois de refrescados rezámos Vésperas calmamente e calmamente meditámos mais um trecho da nossa Regra. Após a oração comemos uma sopa opípera, que até aqueles que não gostam de sopa comeram. É certo que não havia mais nada, mas nem era preciso. Sopa gostosa como aquela já não comíamos há um ano, quando ali ficáramos alojados.
Seguiu-se nova sessão de bolhas, a segunda do dia. E ainda haveria uma terceira que só terminaria depois da uma da manhã. Pelo bem-estar dos peregrinos nada se poupa, nem o sono.
A noite só terminou com um longa celebração de partilha e perdão, como manda a Regra, que recomenda que quando necessário se partilhe a vida comunitária e se corrijam as faltas com caridade. Foi um momento cálido, belo e fraterno que uniu muitíssimo o grupo. Como ali se falaram e se choraram as coisas passadas e sofridas no grupo o narrador lança aqui um véu para que apenas se entreveja sem ver o que ali se passou e celebrou. Seguiu-se depois, como já se disse, a terceira sessão de fura bolhas. À nossa espera estava de novo o chão duro, mas quem pode achar duro o chão se nem tempo tem para pensar, porque se se põe a pensar longo chega a hora de despertar?
Vamos dormir, pois. Fomos, pois, dormir. In Obsequio Iesu Christi. Ámen.

Testemunho III - II Peregrinação a Pé a Fátima

AS PEGADAS QUE ENCONTREI
Há muito que me procuro e não sei por onde ando. Há bem pouco tempo, umas pegadas apareceram no meu caminho e despertaram um pouco a minha atenção. Não sei de onde vêm nem que rumos vão tomar mas decidi tentar segui-las ou pelo menos prestar-lhe mais atenção.
O desafio foi feito, era só mais um. A decisão … a decisão difícil de tomar, pois o caminho não era novidade, era conhecido, muito longo e doloroso, - Pensava eu! Já tinha realizado esta caminhada outras vezes, mas esta foi diferente eu senti-a especial. Era o grupo? A sua dinâmica ou companheirismo? Não sei!... Era uma presença, um conforto, um colo,…uma mão a segurar na minha e a levar-me ao encontro da Mãe.
Cada passo percorrido foi uma descoberta, cada palavra recitada um reencontro, cada um do grupo uma bênção e na chegada uma grande realização de amor e um encontro comigo mesma.
Obrigado a todos, por estes dois dias magníficos!
Recordáreis-vos sempre!

TERESA ROMEIRO, 35 anos, Alhadas

quarta-feira, 7 de maio de 2008

CRÓNICA DUMA PEREGRINAÇÃO ANUNCIADA (III)

Dia 2 - 2 de Maio
Permanecei em mim e eu permanecerei em vós.

São cinco horas da madrugada. É negro lá fora. Não é negro cá dentro. Ouvem-se tun-tuns suaves correndo todas as portas das celas. (Agora já se pode falar de celas, porque os peregrinos já sabem que as celas não são celas.) Os corpos resistem a erguer-se, mas acabam de pé. O meu erguer do esqueleto é um não sei como é: inventei para mim um trejeito de saltimbanco que faria rir o pinheiro mais sisudo. Porém, a coisa resulta: dá para sair da cama, tirar o pijama, lavar a cara, vestir-me e ir até ao refeitório, pondo um pé à frente do outro. É tudo feito quase num só gesto enrolado, feito mais de adivinhas que de saberes. Tudo se queixa no meu corpo. Mas não haverá queixa que impeça o andar com Maria para Jesus. Foi isso que nos propusemos.
Estou a re-aprender a andar. As bolhas supõem uma alteração na equação do equilíbrio e do andar, mas o mais importante é que no fim caminhamos e o caminho lá vai sendo feito. O pequeno-almoço é frugal mas mais que suficiente para o caminho. Dali vamos rezar os Bons Dias ao Senhor e depois caminhar, primeiro em carrinhas que nos devolvem à EN 109 e finalmente a pé. É noite. É chumbo. É frio. Os camiões também peregrinam, furiosos, e ao contrário. Trazem vento e nevoeiro que atiram para cima de nós. É tão frio que a única solução é andar em fila indiana. Aqueles gigantes de ferro e pneus atiram-nos tamanhas golfadas de vento frio para cima de nós, que não há outra forma de caminhar senão, como diz a Regra, com uma armadura de pensamentos santos no peito.
Entretanto, já bailam dentro de nós as Pistas. Somos convidados a permanecer ao longo do dia. A fazer um acto de presença do Senhor. A estar atentos ao que possa ser sinal da Sua presença: um sorriso, uma mão amiga, uma palavra de incentivo, uma ajuda, um conselho, uma flor que se partilha, um versículo da Bíblia, um raio de sol, uma gota de chuva (houve pelo menos uma!), o passeio que se alarga, o canto ou voo dos passarinhos, os ribeiros, os campos, as pessoas, a manhã fresca ou a tarde quente, um pensamento santo, um voto… Existem tantas coisas que nos falam de Deus! Há tanta maneira de Lhe dizer Eu sei que estás comigo e Tu sabes que quero estar contigo!
Foi óptimo caminhar com a cela do coração desperta para a Presença maior que acordou o dia para nós e animou os nossos passos a caminhar!
Amanhã alonga-se e o caminho também. Aloooooooooonga-se muito, muito, muito mesmo. Mas a verdade é que as rectas da Tocha as comemos como quem come carapauzinhos de escabeche, que, como se sabe, depois de comidos não ficam nem espinhas! Num caminho assim tão longo que parece que atrai a solidão são importantes os carros de apoio, que são três. O sr. Branco repete a função e vai sempre a chamar-nos fraquinhos, «sois uns fraquinhos, vamos lá andar!». Também distribui água e bolachas. A Susana repete também a função. Quando está fora do carro, anda sempre aos saltinhos ou a recolher casacos e camisolas ou a dar água e a mimar. (Também nos ofereceu umas pedras grandes para caminhar, mas acabou a fugir de ter de as carregar ela!) Não me admira que dê saltinhos, o António Pedro, o marido, também caminha a pé. E claro, ela anda mais nervosa, porque a melhor parte dela (Deus me perdoe!) anda a ajudar o Pedro a caminhar! Por fim, também a Verónica nos ajuda. Vai ao volante duma grande carrinha. Não faz o trabalho que mais gosta, mas faz com gosto e com sentido de caridade o trabalho que faz. Não é esta a maneira que mais gosta de peregrinar (prefere caminhar) mas foi ali que Deus pediu que fosse e ela vai! (Embora tenha andado muito pensativa) Faz de tudo um pouco: fala, anima, encoraja, lê, põe música, recolhe informações, sugere alterações, cuida dos mais pequenos, cuida dos grandes, organiza os carros de apoio. E no fim, com gosto e a fazer caretas que assustam as bolhas, faz de fura-bolhas. Ainda hoje nos meus sonhos a vejo vestida de D. Quixote Fura Bolhas com a lança em riste! É a melhor fura-bolhas que conheço: vê uma e zás!, vê outra e zás, zás-pás-trás!, atravessa-as com a agulha dum ao outro lado. Quando nós guinchamos já ela furou a quarta e a quinta. A furar bolhas bate mais recordes que D. Quixote a combater moinhos! (E este é um trabalho que ninguém gosta de fazer. A coisa é de tal modo que quando vimos uma bolha botámos logo a fugir! Somos uns mariquinhas porque sabemos que elas nos podem perseguir! E porque o podem nem armados de agulha e linha as conseguimos encarar! Mas a Verónica, não! Zás, zás, zás, zás e zás! Quando damos conta já ela atou com a mesma linha 15 pés de 12 pessoas diferentes, depois de ter furado 144 bolhas!)
Chegamos por fim a Ervedal com uma hora de avanço. O Restaurante está no mesmo sítio e promete a mesma carne grelhada de há um ano! Comeremos com a mesma sadia vontade que temos quando comemos caminhos.
As Alhadas estão ali a dez ou doze quilómetros, mas ninguém quer lá chegar desfalecido. Por isso, abençoamos a refeição e comemos. E repousamos.
Estávamos postos em ledo post-prandium quando o sorriso da Alice Montargil nos surpreende e assalta. Vem passar revista às tropas, ela que é quem mais tempo leva de jovem carmelita! Vem também para partilhar connosco um café e o que falta do caminho. Já conhece muitos dos peregrinos e muitos outros não. Mas ficará a conhecer. Entretanto, o sol descobriu-se e está muito calor. O que vale é que haverá muitos pinheiros pelas veredas e a sombra promete ser caridosa connosco. Além disso vamos rezar o Terço, que será sempre a parte melhor do caminho. Mais uma vez será.
Na placa de S. Amaro da Amoreira não resistimos e tiramos uma foto. Aquele nome traz-nos boas recordações. É a partir dali que rezaremos o terço. Mas não sem antes as pessoas nos chamarem tolinhos três ou quatro vezes, porque «Fátima não é para aí!». E não será mesmo, mas nós sabemos que há «para aí» uma casa da Mãe, chame-se ela Fátima, Carmo, Clara, Maria da Luz, Teresa ou Alice. E foi mesmo por ali que fomos a rezar o Terço.
Chega por fim a Capela de S. Amaro. A porta está aberta e é ali que concluímos a nossa oração, cantámos e recebemos a bênção. O povo acorre, junta-se, quer-nos seduzir com água fresquinha (que aceitámos), mas não parámos porque os peregrinos foram feitos para andar. A meta ainda não foi alcançada e temos de partir mesmo. Pessoalmente apetece-me parar, mas a pior parte de mim diz-me que devemos andar porque depois custa imenso a pôr a máquina a vapor a andar. Apetece ficar ali com o povo, mas talvez seja melhor ir com Deus. Enfim!
Chegados às Alhadas homenageamos as padeiras (deve haver algures uma foto como prova). Depois fomos para a igreja paroquial. Ao perguntar onde fica a Igreja, as pessoas respondem: - Qual?, e têm razão, porque são duas, a Católica e a Protestante. Quando respondemos: - A de São Pedro!; dizem-nos: - Vão por ali. E fomos.
As portas da Igreja de S. Pedro das Alhadas estão fechadas e ainda não foi desta que fomos conhecer o Padroeiro. Subimos, pois, mais um pouco e parámos junto ás portas do Centro Social Água Viva. Está ali um magote de velhinhos que não sabe se rir se chorar. É que vamos chegando às pinguinhas, umas pinguinhas renitentes, cansadas e suadas, que não dá gosto nem ver. Os trejeitos dão para rir, as dores que se vêm dão para chorar. Mas julgo ler nas suas caras um desejo de amanhã partir connosco, nem que seja de cadeira de rodas.
Quando alcançamos juntar a tropa as meninas vão para o carmelo da Alice Montargil e os rapazes ficam-se pelo Centro. Havemos de nos reunir mais tarde para nova sessão de fura bolhas, para o jantar sempre sereno, alegre e familiar com os nossos amigos de Alhadas, para celebrarmos a Eucaristia e para o debate final sobre as presenças diversas de Deus no caminho.
Tragamos o jantar num piscar de olhos e logo nos vimos a celebrar a Eucaristia. Havia ali amigos e amigas de comunidades várias, que já nos conhecem doutras carminhadas. Conheceram-nos aqui e além e acham que somos um vírus. Não dizem se benigno, mas ao que parece a coisa não está para passar. Gostam de nos ver, de cantar e rezar connosco. O vírus pegou e tardará em sair. Reclamam que vamos mais além, que rompamos fronteiras. Reclamam e a ver o que se verá.
Na Eucaristia estão quatro jovens peregrinos de Alhadas que carminharão connosco amanhã e no decorrer da mesma chegarão três outros jovens peregrinos. Estes trazem com eles uma história engraçada: vêm a caminhar há largas horas, com o sistema de GPS ligado. Ao chegar a Alhadas resolvem seguir a intuição e não o GPS. Assim, quando ele recomenda virar à direita seguirão em frente. Ou ao contrário. Chegarão, sãos e salvos, à Eucaristia, depois de percorrer as tortuosas ruas da povoação. E em jeito de confidência dirão: «O GPS estava errado, por isso decidimos seguir a Estrela!» Seguiram? Parece que sim. O certo é que chegaram a tempo de receber a pedra com que amanhã terão de carregar no bolso ou na mochila. Entretanto a Eucaristia decorre e porque é dia de S. Atanásio, o presidente da celebração recorda a frontalidade e a resistência pela verdade de que este santo bispo foi perfeito modelo. E socorrendo-se ainda do número dezasseis da nossa Regra, recordou-nos insistentemente que a nossa vida de fé é um duríssimo combate que não devemos evitar, porque no fim lá está Quem melhor pode pagar. Terminada a Eucaristia e terminado o debate no Centro, regressaremos todos para dentro dos sacos cama. Urge descansar, porque o dia de amanhã avizinha-se longo, duro e cansativo.

As bolhas... da Peregrinação a Pé

CRÓNICA DUMA PEREGRINAÇÃO ANUNCIADA (II)

Dia 1 - 1 de Maio
Que palavras são essas que trocais entre vós?

À hora em ponto uns suaves tun-tuns nas portas dos quartos recordavam-nos que estávamos na hora certa para erguer o esqueleto. Os mais ansiosos levantaram-se logo, os mais acomodados deram ainda volta e meia no saco-cama. Mas não havia nada a fazer. Começara a marcha! Já nada a podia deter! Observado o tempo com olho de áugure logo deu para entender que nem o tempo nos deteria.
Arrumamos os quartos, enfiamos os sacos, limpamos as migalhas do pequeno-almoço. E reunimo-nos de novo na Sala dos Claustros para a Oração de bênção do Peregrino. Logo depois com a voz embargada e com os pés decididos fomos para a estrada.
Alguns amigos despediram-se de nós.
Saímos mais cedo uma hora que no ano passado. E ainda assim encontrámos alguns conhecidos que, despertos, nos saudaram:
- Aonde vão?
- Vamos para Fátima!
– Então, que Deus vos acompanhe.
E seguimos. E parámos. Tínhamos criado para esta peregrinação uma actividade nova. Chamava-se Pistas. As Pistas são um despertar para algum pormenor do caminho ou do dia. São uma tentativa de sublinhar algum aspecto a ter em conta. São uma catequese, uma formação ou oração. Enfim, um plus daquele dia. As Pistas do primeiro dia tinham a ver com o tema desse dia: «Que palavras são essas que trocais entre vós?». Ou seja, urgia trocar palavras entre nós. Sobretudo com os menos conhecidos de nós. Dizer e compartilhar as palavras e sentimentos que nos aqueciam (ou arrefeciam) o coração. Palavras que Ele, caminhante connosco, pudesse escutar, acalentar, reforçar. Ouve, assim, ao longo de toda a manhã e de quase toda a tarde um longo momento de parlapiê cheio de alegria e de diálogo.
Em Vagos voltamos a parar no mesmo jardim da mesma capela fechada. Aterrámos nos bancos do jardim, bebemos água e uma maçã ou doce, ou ambos, e levantámos o esqueleto. Levantámos, quer dizer, queríamos levantar. Que terrível é levantar o esqueleto quando ele se espalmarra daquela maneira. E o mais difícil é pensar ou aceitar que os poucos quilómetros andados são pouco mais que o aquecimento, pouco mais que o início da peregrinação! E cai-nos no coração um pensamento em forma de pingo de chumbo negro: será que vai ser sempre assim? Será que terei de sofrer tudo isto outra vez?
E por cima de nós paira um ameaço negro de chuva portentosa.
Continuamos o caminho. Não há tempo a perder. Não há tempo para ter medo da chuva. Continuamos no parlapiê, agora com outros amigos porque o reajuntamento permitiu, entretanto, trocar de parceiros de caminho.
Ao fim da manhã chegamos a Santo André de Vagos, ao mesmo restaurante que nos recebera na primeira peregrinação. Já ali somos conhecidos. E, parece até, esperados. A senhora, bastante jovem, atende-nos com respeito e prontidão. Quando por fim nos despedimos é ela quem nos dá a gorjeta para deixarmos no Santuário em velas a arder. Ora aqui vai mais uma intenção na nossa peregrinação: um coração de mãe e outro de filha bebé por quem rezar!
Começámos refeitos e ligeiros a segunda etapa do dia. Há já algumas queixas, mas muito bom humor. Percorremos algum tempo a palrar até que chegam as rectas de Calvão. Ali formamos para rezar o Terço. É o melhor momento do dia. Caminha-se a rezar, em conjunto, calmamente, com Jesus e Maria. (A meio da recitação do Terço dá-se uma aparição: A Nininha, que é filha da Nina, aparece-lhe e o coração da mãe derrete-se. O corpo, ou melhor, tudo, o corpo, a alma e o espírito maternos dão um salto, saltam ave-marias e padre nossos e as linhas da estrada, e os braços estreitam a filha no peito. A mãe chora. A filha chora. Mas nenhuma sabe porque chora. Porque afinal, Fátima é já ali!)
Quando termina o Terço algum dos caloiros quer rezar mais, por que é bom caminhar assim. Mas não dá. Não haja dúvida que é bom, mas a prudência recomenda que se acelere o passo. E aceleramos o passo. Pelo menos os que podem aceleram o passo. Havemos de chegar todos ao fim da etapa do primeiro dia. Um dos peregrinos chega de carro à meta com palavras de choro, angústia e desilusão. «O sistema bloqueou!», diz. Quer desistir, porque não consegue dar um passo. Acaba aceitando passar pelo hospital, em Aveiro, onde o aguarda uma equipa de retaguarda. Demora-se pouco tempo no hospital. Os médicos vêm o sistema e encontram tudo bem. Devolvem-no à procedência recomendando prudência mas não impedindo a caminhada a pé.
Entretanto, fomos muito bem recebidos na Casa da Sagrada Família da Nazaré. Há uma festa à porta, porque na região o primeiro de Maio é celebrado no campo: o povo quer o cheiro a erva fresca e a flores, o cantar dos passarinhos e do vento.
Tomámos banho, refrescámo-nos e a Delfina fura-nos as bolhas. Há uma caloira que promete um filme por cada bolha furada. A primeira deu um filme cómico único. Quem viu viu, quem não viu visse! Infelizmente não furará mais bolhas. Preferirá caminhar três dias em cima das bolhas que furá-las. É assim mesmo heroína! O jantar foi regalado e o cúmulo foram as natas do céu que a D. Orquídea nos veio trazer. Ninguém resistiu. Todos comeram e enquanto comeram ninguém se queixou de dores, nem nos dentes nem nos pés! O remédio está encontrado: um doce por cada dor!
Um regalo foi também o recreio com canções de todos os tops. A Nina fez de disc-jokey e começou todos os hits. Não escapou um! Ainda deu para dançar a dança do pé-coxinho, que é mais sugerida pelas dores das bolhas furadas e pelos músculos doridos que pelo jeito para a dança.
Terminamos o dia com a oração da noite, mas não sem antes nos dizermos compartilhando longamente as palavras que trocámos entre nós, que nos animaram, que não nos deixaram desistir. E surgiram ali tantas palavras belas, tantas palavras doces e animosas, palavras que são mais Deus que dos homens!
Por fim era já tarde e os corpos reclamavam descanso. Tínhamos cinco horas de descanso pela frente. Havia que aproveitar a presença dos Anjos que nos convidavam a dormir.
E fomos dormir.