quarta-feira, 26 de novembro de 2014
Papa Francisco no Parlamento Europeu
O papa Francisco discursou perante o Parlamento Europeu, em Estrasburgo. Apresentamos aqui alguns excertos da sua intervenção:
Aborto, eutanásia
«O ser humano corre o risco de ser reduzido a uma mera engrenagem de um mecanismo que o trata como um simples bem de consumo para ser utilizado, de modo que – lamentavelmente o percebemos com frequência -, quando a vida já não serve para esse mecanismo, é descartada sem muitos reparos, como no caso dos doentes terminais, dos idosos abandonados e sem atenções, ou das crianças assassinadas antes de nascer.»
Cristianismo
«Uma história bimilenária liga a Europa e o cristianismo. Uma história que não é privada de conflitos e de erros, também de pecados, mas sempre animada pelo desejo de construir para o bem. Vemo-lo na beleza das nossas cidades, e mais ainda na das múltiplas obras de caridade e de edificação humana comum que constelam o continente. Esta história, em grande parte, está ainda por escrever. Ela é o nosso presente e também o nosso futuro. Ela é a nossa identidade. E a Europa tem forte necessidade de redescobrir o seu rosto para crescer, segundo o espírito dos seus pais fundadores, na paz e na concórdia, porquanto ela própria não está ainda isenta de conflitos.»
Deus
«Uma Europa que não é capaz de se abrir à dimensão transcendente da vida, é uma Europa que corre o risco de perder lentamente a própria alma, e também aquele “espírito humanista” que, todavia, ama e defende.»
«Um dos mais célebres frescos de Rafael que se encontram no Vaticano retrata a denominada “Escola de Atenas”. No centro estão Platão e Aristóteles. O primeiro com o dedo que aponta para o alto, para o mundo das ideias, podemos dizer para o céu; o segundo estende a mão para a frente, para quem olha, para a terra, a realidade concreta. Parece-me uma imagem que descreve bem a Europa e a sua história, feita do contínuo encontro entre céu e terra, onde o céu indica a abertura ao transcendente, a Deus, que desde sempre distinguiu o homem europeu, e a terra representa a sua capacidade prática e concreta de enfrentar as situações e os problemas.»
Dignidade humana
«Promover a dignidade da pessoa significa reconhecer que ela possui direitos inalienáveis de que não pode ser privada pelo arbítrio de alguém, e muito menos em benefício de interesses económicos.»
«Afirmar a dignidade da pessoa significa reconhecer a preciosidade da vida humana, que nos é dada gratuitamente e não pode, por isso, ser objeto de troca ou de comércio.»
Economia
«Chegou a hora de construir a Europa que gire não em torno da economia, mas em torno da sacralidade da pessoa humana.»
Esperança
«Ao dirigir-me hoje a vós, a partir da minha vocação de pastor, desejo enviar a todos os cidadãos europeus uma mensagem de esperança e de alento. Uma mensagem de esperança baseada da confiança de que as dificuldades podem converter-se em fortes promotoras de unidade, para vencer todos os medos que a Europa – juntamente com todo o mundo – está a atravessar. Esperança no Senhor, que transforma o mal em bem e a morte em vida.»
Família
«A família unida, fértil e indissolúvel transporta com ela os elementos fundamentais para dar esperança ao futuro. Sem tal solidez acaba-se por construir sobre a areia, com graves consequências sociais. Por outro lado, sublinhar a importância da família não só ajuda a dar perspetiva e esperança às novas gerações, como também aos numerosos idosos, muitas vezes obrigados a viver em condições de solidão e de abandono porque deixou de existir o calor de um lar doméstico capaz de os acompanhar e apoiar.»
Fome
«Não se pode tolerar que milhões de pessoas no mundo morram de fome, enquanto toneladas de sobras de alimentos se descartem diariamente das nossas mesas.»
Migrantes
«Não se pode tolerar que o mar Mediterrâneo se converta num grande cemitério. Nas barcaças que chegam diariamente às costas europeias há homens e mulheres que necessitam de acolhimento e ajuda. A ausência de um apoio recíproco dentro da União Europeia corre o risco de incentivar soluções particulares do problema que não têm em conta a dignidade humana dos imigrantes, favorecendo o trabalho escravo e contínuas tensões sociais.»
Solidão (idosos, jovens, pobres, migrantes)
«Uma das doenças que vejo mais espalhada hoje na Europa é a solidão, própria de quem está privado de laços.»
«Isto vê-se particularmente nos idosos, muitas vezes abandonados ao seu destino, como também nos jovens privados de pontos de referência e de oportunidade para o futuro; vê-se nos numerosos pobres que povoam as nossas cidades; vê-se nos olhos perdidos dos migrantes que vêm cá à procura de um futuro melhor.»
Trabalho
«Que dignidade pode alguma vez encontrar uma pessoa que não tem o alimento ou o mínimo essencial para viver, e, pior ainda, o trabalho que o unge de dignidade?»
«É tempo de favorecer as políticas de emprego, mas sobretudo é necessário voltar a dar dignidade ao trabalho, garantindo também condições adequadas para a sua execução. Isto implica, por um lado, encontrar novas maneiras para conjugar a flexibilidade do mercado com a necessidade de estabilidade e certezas de perspetivas laborais, indispensáveis para o desenvolvimento humano dos trabalhadores; por outro lado, significa favorecer um adequado contexto social que não esteja apontado à exploração das pessoas, mas a garantir, através do trabalho, a possibilidade de construir uma família e educar os filhos.»
União Europeia
«O moto da União Europeia é “Unidade na diversidade”, mas a unidade não significa uniformidade política, económica, cultural ou de pensamento. Na realidade, cada unidade autêntica vive da riqueza das diversidades que a compõem: como uma família, que é tanto mais unida quando mais cada um dos seus membros pode ser ele próprio até ao fundo, sem medo.»
Fonte: www.snpcultura.org