Os inícios da nova família do Carmo foram difíceis. E o restante também. Aquando da primeira fundação o P. Julián de Ávila testemunhou que existiram «imensas diligências para apagar o fogo que estava abrasando a cidade»:
As monjas do carmelo da Encarnação sentiram a nova fundação como uma afronta e acrescentam que se a Irmã Teresa quer ser santa pode sê-lo ali. E obrigam-na a regressar;
A sociedade civil rejeitava a fundação de mais um convento, porque o teria de manter com as suas ajudas e esmolas;
A Câmara Municipal combateu a fundação declarando que os muros do convento projectavam sombra sobre as fontes públicas;
Por fim, as autoridades religiosas temem que o novo convento seja um refúgio de mulheres heréticas – as iluminadas.
Avisadamente, alguns amigos da Irmã Teresa de Jesus avisam-na da existência de um complot para acabar com o seu projecto: «Vieram-me dizer, muito assustados, que, por aqueles dias tão difíceis, se poderia levantar algum falso testemunho e se me acusasse à Inquisição. Eu não pude senão soltar uma gargalhada, pois jamais tive medo da Inquisição. Eu sabia muito bem que em coisas de fé, de sacramentos da Igreja ou por qualquer verdade da Sagrada Escritura eu me dispunha a morrer mil mortes. Por isso lhes respondi que por aí nada temessem» (Livro da Vida 33,5).
Os poucos amigos que ficaram do seu lado permaneceram fiéis durante aqueles dias tão terríveis:
Francisco de Salcedo aguentou pacientemente todas perseguições e escárnios, pois continuava a ajudar e a visitar as Carmelitas.
O P. Domingo Báñez foi o único que defendeu Santa Teresa quando o conselho da cidade de Ávila se reuniu para tratar do caso. Ao gerar-se consenso para queimar e derrubar o convento, foi ele que advertiu para tal impossibilidade, sob pena de excomunhão, pois o convento fora fundado com as licenças do Bispo e do Papa!
O P. Gaspar Daza celebrou ali a primeira missa e deu o hábito às primeiras quatro noviças. Quando houve de se deslocar a Madrid ali se deslocou, pagando a viagem e estadia do seu bolso durante todo o tempo necessário para defender as Carmelitas perante do Conselho Real, para onde a cidade de Ávila havia recorrido.
Meio ano depois, o P. Pedro Ibáñez deslocou-se de Ávila ao encontro do Provincial dos Carmelitas para alcançar dele as licenças necessárias para que a Irmã Teresa de Jesus e um punhado de monjas saíssem do convento da Encarnação e entrassem no de São José.
Quando teve de falar dos seus trabalhos, Teresa confirma que o primeiro que fez foi ensinar as noviças a rezar a Liturgia das Horas. E diz que elas eram «quatro pobres órfãs», o que leva a supor que antes teve de as ensinar a ler, coisa que, aliás, posteriormente aconteceu mais que uma vez.
Por fim pôde iniciar o seu tão desejado estilo de vida. Nessas alturas tão difíceis o Senhor consolou-a, fazendo-a ouvir na oração que «esta casa é um cantinho de Deus, o paraíso do seu deleite» (Livro da Vida 35,12).
Quando as pessoas foram conhecendo a maneira de viver de Teresa e das suas freiras, venceram-se todos os preconceitos e muitos se afeiçoaram a elas a ponto de se tornarem seus benfeitores; «Muita era a devoção que as pessoas começaram a ter a esta casa» (Livro da Vida 36:32).
Entretanto, no conventico de São José florescem os princípios fundamentais da tradição carmelitana e fundem-se a ela novas intuições que iluminarão o futuro com uma das mais fecundas correntes de espiritualidade que alimentam a Igreja.
As freiras do carmelo de São José serão um pequeno «colégio de Cristo» que agrupa no máximo 13 mulheres (12 como os apóstolos à volta do Senhor; mais tarde o número subirá para 21!). Era uma comunidade pequena, mas empenhada e vocacionada. Eram mulheres que encontraram em Cristo o seu amigo, companheiro e esposo. Com Ele se querem alegrar, a Ele estão dispostas a consolar e por Ele não lhes preocupa morrer. A sua austeridade de vida tinha um objectivo: centrar-se no essencial; a sua alegria contagiante e a sua constante oração pelos defensores da Igreja convertê-las-ão em sal, luz e levedura de que o mundo tanto precisa. O de ontem e o de hoje.