quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Crónica da II Noite Escura - Caíde de Rei

Nova experiência para falar
Crónica da segunda Noite Escura


Caíde de Rei, Lousada, noite do dia 22 de Janeiro de 2011. Era uma noite escura e fria, em que o calor das casas apetecia. Mas, mesmo assim, reunimo-nos no salão da Junta de Freguesia de Caíde de Rei mais de trinta jovens para ouvir poesia e ouvir falar dela.
Tudo estava bem preparado, um cenário acolhedor e familiar que os Jovens Sementinhas tomaram como missão construir. Havia um pano de fundo que realçava o tema deste encontro: “Não direi coisa que não tenha experimentado”, que tinha sido proferido por Santa Teresa de Jesus, uma poetisa do século XVI, que nos inspira e guia.
Era hora de começar e estava presente Caíde de Rei, Paços de Gaiolo e Viana do Castelo. Através da breve apresentação que o Jorge Fernando fez, ficamos a saber que quem nos iria falar era a fotógrafa e arquitecta, Marta Nunes e o poeta e editor João Manuel Ribeiro. Iniciou-se assim uma conversa familiar com uma pergunta que, embora não tenha sido dita, pairava no ar: “O que é a poesia?”.
João começou por nos dizer que “a poesia eleva o Homem acima de si mesmo”, sendo esta a mais bela forma de comunicação desde sempre, uma vez que através de um verso, podem surgir vários sentimentos e interpretações, dependendo de quem o lê. Esta simples pergunta fez-nos vaguear, visto a poesia ser uma tentativa de se dizer o que não consegue ser totalmente dito, usando metáforas para este fim. Assim, aprendemos que de certa forma, um poeta é um “arquitecto de metáforas”.
A certa altura o Jorge salientou o facto da palavra “coração” aparecer muitas vezes na poesia do João. Aí ficamos a saber que este é um órgão vital da sua poesia, que ele tenta fazer com que seja clara, sem complicar a interpretação, esperando ser entendido, pois usa poucas palavras para dizer muito. Segundo o poeta “o que se diz no silêncio vale mais do que as palavras em si”.
Neste domínio assistimos à intervenção da fotógrafa Marta Nunes, dizendo que a poesia é mal vista pois é ensinada nas escolas como algo certo e com uma única interpretação, e não como algo subjectivo cuja análise e definição vária de pessoa para pessoa. Marta falou-nos também de como relaciona a poesia com a fotografia, partilhando connosco que quando lê um poema, relaciona a emoção que este desperta nela com uma imagem, nascendo um trabalho de cooperação entre poesia e fotografia.
Surgiu então a questão da “inspiração”. Teria um poeta necessidade de tal ferramenta? João rapidamente nos fez saber que todos somos poetas quando expressamos os nossos sentimentos, mas que para escrever poesia (um texto elaborado) nem todos têm vocação. Definiu a inspiração como sendo “a predisposição que as palavras encontram para serem escritas”. Tudo isto revelou-se como um mistério uma vez que, segundo João, são pequenos pormenores, rotineiros ou não, que despertam ideias. Assim, um poeta está sempre presente no que escreve, independentemente de quão pouco a sua experiência possa lá estar escrita.
Surgiram questões sobre a relação que se pode criar entre o poeta e o leitor, uma vez que o segundo vai interpretar as emoções do primeiro, fazendo deste uma espécie de “pano de fundo” para a poesia. Contudo não faz sentido impor às crianças tal conhecimento do autor, uma vez que elas interpretam o sentido do poema por si só.
Como tem vindo a ser hábito, o Frei João contribui com uma intervenção construtiva, perguntando: “Quem define melhor uma geração, o poeta ou o Cristiano Ronaldo?”. A pergunta em si parecia bastante banal, mas o sentido real desta era a noção dos valores contidos nas gerações. Os valores que um poeta deixa são inabaláveis (estão presentes nos seu livro), podendo ser esquecidos mas nunca apagados. Por outro lado, os valores monetários e materiais são os que predominam na actualidade.
Estávamos no fim desta conversa bastante construtiva quando Marta, Jorge e João nos presentearam com a declaração de alguns versos da poesia de João acompanhados por música de fundo. Fizeram-nos meditar naqueles versos simples e cheios de sentido.
Seguiu-se um pequeno e apreciado momento musical ao vivo protagonizado pela Maria, antes do habitual convívio entre os participantes na companhia de chá e bolos.
Uns mais cedo e outros mais tarde, todos abandonaram fisicamente, mas nunca em espírito, o calor e a amizade que só um encontro da família Carmo Jovem nos pode oferecer. Voltamos ao frio e ao escuro da noite, mas desta vez com uma nova experiência para falar.
E obrigado pela visita!


Francisco de Babo Martins & Ana Maria de Babo Martins

(Jovens Sementinhas, Caíde de Rei)